OAB-BA discute segregação espacial e direito à moradia em Salvador
"A questão urbana em Salvador: segregação espacial, direito a moradia e especulação imobiliária". Este foi o tema da audiência pública realizada pela OAB-BA, por meio da sua Comissão de Direitos Humanos, na manhã desta sexta-feira (06/05). O evento aconteceu no auditório da seccional, na Rua Portão da Piedade, e contou com a participação de representantes de ONGs e de movimentos sociais, estudantes, políticos, membros dos poderes públicos, conselheiros e advogados.
Abrindo o debate, o professor do departamento de Planejamento da Faculdade de Arquitetura da UFBA, Gilberto Corso, traçou um panorama sobre os padrões da segregação socioespacial em Salvador: “Ao concentrar um mesmo grupo social numa mesma região, a segregação cria hierarquias entre territórios, fazendo com que determinados bairros tenham maiores ou menores Índices de Desenvolvimento Humano (IDH)”, disse.
Sobre as questões da moradia na cidade, o relator do Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano (PDDU) na Câmara Municipal de Salvador, vereador Léo Prates, afirmou que existe uma carência da regulamentação de leis ligadas ao planejamento territorial. “Salvador está sofrendo um processo de adensamento, que não vem sendo acompanhado pelo cumprimento das suas normas de planejamento e vem causando a ausência de áreas livres nos bairros. Daí a importância do PDDU em criar essas novas áreas e de ajudar no desenvolvimento organizado da cidade”, disse.
Segundo a defensora pública Bethânia Ferreira, o problema da moradia em Salvador está ligado à “precária regularização fundiária”. Conforme explica a defensora, cerca de 70% da população soteropolitana não tem título de propriedade, o que faz com que procure a Justiça para normalizar sua situação. “Este fato poderia ser amenizado com a transformação de imóveis abandonados em moradias. Só no Centro Histórico, existem cerca de 1.400 que poderiam abrigar mais de oito mil famílias”, disse.
Com opinião semelhante, a diretora da ONG Teto - Brasil, Viviane Soares, afirmou que, na capital baiana, cerca um milhão e 300 mil pessoas vivem na pobreza, sem direito à regularização da sua propriedade. “Existe um plano de desenvolvimento maravilhoso para quem está de fora, mas que não atende as famílias que sobrevivem com R$ 570 reais por mês, como na nossa ONG”, questionou.
Ainda em reivindicação a melhores condições de habitação, o coordenador do Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MSTS), Jhones Bastos, disse que “criar moradia não é jogar a população no fim da cidade ou fora dela, mas ocupar os espaços vazios com moradias dignas”. “É isso que nós fazemos. Nós, as 27 mil famílias do movimento, ocupamos os espaços ociosos, propensos a virar pontos de droga e de criminalidade, e somos taxados de vagabundos por isso. Mas os verdadeiros invasores do colarinho branco são as construtoras, que invadem os terrenos para especulação e enriquecem com isso”, pontuou.
Segundo o conselheiro Gustavo Moris, que também é advogado do empresário dono de 33 dos 36 apartamentos ocupados pelo MSTS no Horto Florestal, desde o dia 10 de abril, de fato, existe uma segregação territorial na cidade e mais, especificamente, no Horto. “Lá, realmente, existe uma avenida separando os prédios grandes das casas cujos donos não têm direito a um título de propriedade. Mas acredito que a solução passa por dar à população o direito à propriedade privada, cobrando dela os impostos devidos, como IPTU, mas oferecendo, também, os serviços que lhe são de direito”, disse.
O público também participou do debate com algumas considerações, como foi o caso da representante da ONG Kingoma Ana Lúcia dos Santos Silva. Segundo a ativista, “o território é uma questão de vida para a entidade”. “A maioria do nosso povo é negro e vive na miséria. Mas nossos territórios são nossos, dos nossos antepassados. Não vamos deixar que nos sejam tomados e ainda nos acusem de ladrões”, disse.
Ao final do evento, o presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB-BA, Eduardo Rodrigues, responsável por coordenar a mesa, afirmou ter ficado satisfeito com o debate e ressaltou o papel da Ordem na mediação de assuntos de interesse da população: “Nosso papel é levantar a discussão para a resolução dos problemas sociais. Como sempre diz o nosso presidente, Luiz Viana, temos a função de ser farol, para vermos longe, e de porto seguro das ideias”, disse.
O presidente da OAB da Bahia, Luiz Viana Queiroz, parabenizou a comissão pelo evento e afirmou estar "ansioso para receber as conclusões a que chegaram os participantes".
Além de Rodrigues e dos debatedores, participou da mesa alta o vice-presidente da Comissão de Direitos Humanos da seccional, Jerônimo Luiz de Mesquita.
Foto: Angelino de Jesus (OAB-BA)