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Nota de repúdio ao desrespeito religioso

Desde que foi criada, em janeiro de 2016, a Comissão de Combate à Intolerância Religiosa da OAB da Bahia emitiu inúmeros pareceres, estudos e notas técnicas, realizou acompanhamentos a delegacias e audiências, e também visitas a escolas públicas, além de seminários, palestras, cursos gratuitos para formação, sensibilização e conscientização da advocacia. Tudo isso sempre abertos(as) à sociedade civil e instituições interessadas e visando nosso maior objetivo: a intransigente defesa do Estado Democrático de Direito, da dignidade da pessoa humana, do exercício da advocacia e do direito à liberdade de consciência e de crença, pela promoção da liberdade religiosa e pelo combate ao desrespeito cravado no falso fundamento da fé. O sentimento coletivo da OAB da Bahia, declarado por meio desta Comissão, frente aos alarmantes casos de crimes de ódio religioso veiculados na imprensa, que dão conta da devastadora realidade baiana de franco, aberto e denso conflito, é de repúdio, de verdadeira aversão às práticas discriminatórias constatadas que revelam a violência em constante metamorfose, e também de irresignação, uma vez que não iremos nos conformar ou arrefecer diante deste cenário.

No primeiro semestre deste ano, a colega advogada Claudia Maria de Amorim Viana, professora da Faculdade Direito da Universidade Católica do Salvador, foi alvo de intolerância religiosa praticada pela direção de uma casa de eventos, juntamente com uma empresa organizadora de festas e solenidades, durante a cerimônia de formatura da turma que a elegera como paraninfa, sendo impedida diante de todos de presentear os alunos e as alunas, na pessoa de uma formanda, com uma imagem de Nossa Senhora. Em seguida, de acordo com o seu relato, corroborado por diversas testemunhas, a advogada teve o som do microfone cortado durante o seu discurso, por ter incluído na fala uma prece espírita.

Além disso, iniciamos o segundo semestre de 2017 perplexos pelos relatos da tormentosa relação trabalhista de uma analista jurídica – que pediu anonimato - com sua empregadora, uma grande concessionária de telefonia fixa e móvel. A vítima declarou ter sido ostensivamente assediada moralmente por sua chefe imediata, que se dedicava a desqualificar tanto a fé exercitada pela empregada, que professa a umbanda como religião, quanto a sua colocação profissional na empresa, contribuindo, assim, para a instalação de um quadro de depressão e desenvolvimento da Síndrome de Burnout, ambas relacionadas à angústia psicológica advinda das perseguições, o que fora registrado em gravações fonográficas.

A cada vítima consciente de seus direitos que torna públicas as ofensas sofridas e, em manifesto destemor, transforma a sua dor individual em luta coletiva, incontáveis outras seguirão encorajadas a romper o ciclo da violência: seja através da denúncia e deflagração de expedientes administrativos, seja pela adoção de medidas judiciais reparatórias (vide arts. 186, 187, 927, 932 e 933 do Código Civil) ou mesmo de inquérito policial e processo penal (vide arts. 140, §3º e 208 do Código Penal e art. 20 e §§ da Lei nº 7.716/89).

Esse é o Direito desvelado em Justiça.

A Comissão de Combate à Intolerância Religiosa manifesta-se, portanto, em apoio a estas notáveis mulheres que simbolizam as vítimas diárias da intolerância e racismo religioso na Bahia e no Brasil, ao passo em que reafirma o seu compromisso na promoção, proteção e defesa da liberdade religiosa e repudia toda forma de violência.

Esta nota tem, também, o intuito de promover um chamamento às instituições integrantes do poder público, a fim de que, unidas à OAB-BA e à sociedade civil, possamos construir colaborativamente caminhos para o fortalecimento da cidadania, mediante a conscientização popular e o combate a todas as formas de desrespeito religioso, começando pela implementação da Delegacia Especializada de Combate ao Racismo e à Intolerância Religiosa, nos termos do art. 79 do Estatuto da Promoção da Igualdade Racial e Combate à Intolerância Religiosa.

Maíra Vida
Presidente da Comissão de Combate à Intolerância Religiosa da OAB-BA
Informações: [email protected]