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Bahia Notícias: Luiz Viana quer discutir com sociedade e OAB limites de tolerância da democracia

por Cláudia Cardozo / Bahia Notícias

Diante da situação do país e do Brasil pós-impeachment, o presidente da seccional baiana da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-BA), Luiz Viana, quer convocar a sociedade para discutir o limite da tolerância democrática. Ao Bahia Notícias, Viana, que comanda a Ordem por mais uma gestão e sempre se declara um defensor nato da democracia, afirma que é difícil fazer uma previsão sobre o que o impeachment da presidente Dilma Rousseff representará para a história do Brasil. “O que isso vai significar na história, só o tempo dirá. Já existe um marco, que é a presidente que foi impedida. Eu disse inúmeras vezes, em inúmeros lugares, e a minha entidade, inclusive o meu conselho, fez manifestação favorável ao impedimento da presidente da República, mas eu tenho ressalvas quanto a fundamentação”, afirma.

Viana destaca que o impeachment é um processo formalmente jurídico, mas que ele é “materialmente político”. “Eu entendo, compreendo as críticas que são feitas, inclusive no sentido de que o fundamento, a causa para deliberar, que são as pedaladas fiscais seria crime de responsabilidade. Essa é uma questão muito delicada, porque esse é um juízo jurídico, mas a deliberação não será jurídica”, explica. O presidente da OAB baiana afirma que, apesar do impeachment ter sido deflagrado por uma maioria de parlamentares, isso não quer dizer que todos devam admitir e aceitar. “A grande riqueza da democracia é encaminhar esses conflitos de uma forma pacífica. As pessoas confundem o que é a democracia. As pessoas confundem, porque ela permite os conflitos, que permite propostas distintas e que se encontre mecanismos para decidir quais daquelas propostas serão implementadas. Mecanismo formal majoritário por exemplo.

No caso do impeachment, um mecanismo formal majoritário de dois terços da Câmara e dois terços do Senado”, salienta, indicando que esse é o limite de seu posicionamento enquanto representante da OAB, tendo em vista as posições da Ordem nacional. “Não devo avançar para fazer um juízo de valor se aquilo é crime de responsabilidade ou se não é. Eu tenho ressalvas, e já disse isso publicamente”, frisa.

Luiz Viana diz que o momento é de pensar em uma reforma política que não seja superficial, e que a população vive um “momento limítrofe”. “O afastamento de uma presidente eleita é um momento limítrofe da política, e nesses momentos limítrofes, o que eu penso é que as deliberações deveriam ser calcadas em um juízo de profundida, sobre os elementos da crise, sobre qual é o melhor caminho, ao contrário, o que eu vejo é que as deliberações são tomadas com uma superficialidade assustadora”, sinaliza.

Em uma avaliação da situação do país, Viana volta a afirmar que enxerga a situação com muita preocupação o “maniqueísmo moralista do bem contra o mal”. Viana diz que o quadro atual “camufla a realidade social”. “A realidade social é complexa. As pessoas não são boas ou más em si mesma, elas podem tomar atitudes boas ou más a partir de critérios de que avalia a conduta, que vai dizer se é boa ou mal. E esses valores vão sendo construídos em conflito. Tem coisas, decisões políticas que estão sendo tomadas agora, que grupos olham e detestam, acham que aquilo é o mal e grupos que olham e dizem que aquilo é o bem. O problema é que esses conflitos são de uma sociedade complexa que não são só políticos – divisão da sociedade em classe, conflitos de gênero, conflitos raciais, conflitos econômicos, religiosos, morais – isso não gera uma disputa maniqueísta entre o bem e o mal. Isso gera vários conflitos. E a sociedade democrática é aquela que diz: é bom que seja assim, que cada um faça sua opção e apresente. A democracia diz que só não pode acabar com ela”, analisa.

Ele vai além e diz que está instalado no país um quadro de alienação, em todos os cantos, inclusive na política, e que a política não é regida pela lógica do bem contra o mal. “Ela é regida por conveniência política. A política é o campo do espaço público, onde as pessoas se manifestam. Se elas não se manifestam, não tem política. As democracias, ao longo da história ocidental, têm criado mecanismos para decidir qual caminho seguir, entre os quais, talvez o mais importante, o critério majoritário, que decorre da igualdade, que não é um critério qualitativo. Mas as pessoas estão confundindo isso com uma questão moral”, afiança.

Ele quer que o país discuta seus problemas, seus conflitos, e que o afastamento de Dilma e a posse interina de Michel Temer não resolverá esses conflitos, pois “são problemas estruturantes”. “É preciso ter um diálogo aberto sobre isso para encontrar caminhos para solução”. Como cidadão brasileiro, a margem das preferencias políticas, Viana diz ter esperança de que o Brasil consiga encontrar um caminho de pacificação dos conflitos sociais e superar as diferenças estruturantes “tão agressivas”.

Sobre a atuação da OAB neste momento, o presidente da seccional diz que a Ordem “tem que encontrar seu caminho e seus limites”. “O que a OAB pode fazer é dizer as pessoas, falar de suas bandeiras históricas, como defender a democracia, os direitos fundamentais, mas também encontrar seus limites. A OAB pode contribuir, mesmo sendo umas das proponentes do impeachment, pode contribuir construindo pontes para o diálogo entre a sociedade civil e a sociedade política”, declara. Viana também disse que há uma confusão muito grande em torno do termo “golpe”, e que, se for analisado pelo aspecto jurídico, dirão que não há, pois segue o rito do Supremo Tribunal Federal, mas que, se a discussão for política, “aqueles que consideram que houve uma quebra da legitimidade da presidente da República de continuar, estão chamando de golpe”. “Não cabe a OAB querer e pretender ser protagonista de tudo. Eu faço um esforço enorme para tentar ter prudência naquilo que eu vou falar, do ponto de vista da OAB, mas não de tudo”, finaliza. Fonte: Bahia Notícias
Foto: Angelino de Jesus/OAB-BA.