Advocacia faz alerta ao STF e pede atenção à segurança jurídica
O presidente da OAB da Bahia, Luiz Viana Queiroz, esteve ao lado do presidente da OAB de São Paulo, Marcos da Costa, na tarde da última quarta-feira (28/03), para leitura do Manifesto em Defesa da Justiça, que ocorreu no andar térreo do prédio sede seccional paulista, reunindo advogados e advogadas representantes de diversas instituições.
O objetivo foi fazer um alerta ao Supremo Tribunal Federal (STF), cujo ambiente atual é de disputa, regado a debates acalorados e marcado por ofensas pessoais, a exemplo do episódio pontual que ocorreu entre ministros em meados de março. Diante desse clima delicado em que vive o país, com discursos de ódio ganhando terreno por todos os lados, é fundamental que a mais alta Corte de Justiça brasileira – hoje um grande foco de atenção da sociedade –, seja exemplo de debates equilibrados e de urbanidade. Além disso, sobretudo, é indispensável manter-se nos limites da lei sem interferir em campos de outros poderes. Na oportunidade, Luiz Viana destacou que defender a Justiça, hoje, exige defender a Constituição.
Quando o próprio guardião da Carta Magna a desrespeita põe em risco a segurança jurídica em um país que atravessa uma crise política e moral, ao mesmo tempo que se debate para superar um de seus piores momentos econômicos da história recente. Logo no início do evento, o presidente da Seção São Paulo da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB SP), Marcos da Costa, leu o ‘Manifesto em Defesa da Justiça’ assinado pela Secional da Ordem e mais 11 instituições. O dirigente vem criticando a postura dos magistrados do STF desde o áspero diálogo entre eles transmitido pela TV Justiça: "O episódio que culminou com a troca de ofensas entre juízes da nossa mais alta Corte de Justiça, insere-se entre os mais contundentes de toda a história do Supremo", acentua. Para ele, no cenário atual e mesmo sendo a esfera política o alvo central da crise, são visíveis os sinais de que o Judiciário perde seu vetor de força quando deixa que o individualismo, que acirra disputas pessoais, se sobreponha ao soberano conceito de uma instituição. "A partir desse evento, devemos refletir sobre a importância do papel que a Suprema Corte exerce, especialmente por vivermos hoje em um país absolutamente dividido, em que avolumam-se os discursos de intolerância. Esperamos que seja o STF o templo sagrado do Direito, da Justiça e que, através dele, se promova a pacificação".
Signatários
O Manifesto destaca que a Suprema Corte é, para a Nação, a instituição depositária das esperanças de respeito aos valores maiores do Estado de Direito e que a insatisfação com os rumos do país não autoriza o descumprimento da Lei e da Constituição Federal e tampouco autoriza a definir novas regras, a não ser pelo processo legislativo articulado pelos representantes eleitos pelo povo. Assinaram o documento, além da OAB SP, a Associação dos Advogados de São Paulo (AASP); o Instituto dos Advogados de São Paulo (IASP); o Centro de Estudos das Sociedades de Advogados (Cesa); a Associação dos Advogados Trabalhistas de São Paulo (AATSP); o Movimento de Defesa da Advocacia (MDA); o Sindicato das Sociedades de Advogados dos Estados de São Paulo e Rio de Janeiro (SINSA); a Academia Brasileira de Direito Criminal; a Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas; a Academia Internacional de Direito e Economia; a Academia Paulista de Letras Jurídicas e Conselho Superior de Direito da Fecomercio.
Assim como o alerta aos integrantes do STF, os advogados reforçaram que a iniciativa almeja chamar a atenção da sociedade civil em relação aos seus direitos, que começam a ser questionados. Para advogados, a reavaliação do funcionamento do Judiciário ou de quaisquer instrumentos jurídicos deve ser feita no lugar adequado, que é o Poder Legislativo. As ingerências que têm sido feitas pelo Tribunal preocupam juristas já que colocam em risco direitos conquistados. O advogado Ives Gandra da Silva Martins, que preside o Conselho Superior de Direito da Fecomercio, deteve-se justamente às críticas à invasão de poderes. “O Estado Democrático de Direito existe na realidade através da atuação de poderes harmônicos e independentes, cada um com sua competência definida”, resumiu Gandra. “Todo o mecanismo de pesos e contrapesos para garantir harmonia e independência dos poderes por um lado e, por outro, o Estado Democrático de Direito, foram inclusos na Constituição Federal”. Ainda para Gandra, que também citou o excelente nível de competência dos magistrados, o sentido de colegiado visto até 2003 se perdeu.
Os organizadores enfatizaram que o Supremo 'volte a ser apenas o Supremo'. “Para que o Tribunal não legisle em nome do Legislativo e não administre em nome do Executivo”, destacou o jurista Ives Gandra. Como exemplo, ele citou interferência em competências privativas, como a de concessão de indultos – algo cabível ao Presidente da República. “Até as agressões nas sessões são próprias de uma Câmara de Deputados, onde se há uma posição ideológica, o político se irrita com a outra posição e, então, xinga os seus adversários. Nunca houve isso no Supremo. Começou a ocorrer porque a discussão passou a ser política e não mais Judiciária”, disse Gandra. “Tenho profunda admiração por eles e são magistrados idôneos, mas não podemos deixar de alertá-los para que reflitam”.
Para advogados, a segurança jurídica é a espinha dorsal do debate atual. “Espero do nosso Poder Judiciário a necessária segurança jurídica, mais importante até que os rumos de determinadas decisões. É termos a segurança de que nossa estrutura jurídica responde de modo firme, seguro. É preciso ver respeito à Constituição, seriedade nos julgamentos”, disse Fábio Romeu Canton Filho, vice-presidente da Ordem paulista.
Já Luiz Périssé Duarte Junior, presidente da AASP, estendeu a análise. “Sabemos que o STF é o interprete da Constituição, mas a interpretação tem limite e, esse limite, é o texto. Não se pode interpretar ignorando-o”, disse. “O STF, com toda sua relevância no quadro institucional brasileiro, tem ainda papel no sentido sociológico, no que representa para o brasileiro no dia a dia. O cidadão comum quer ver na Corte a garantia da paz social e a composição dos conflitos feita de forma adequada”.
Os ex-presidentes da OAB SP, João Roberto Egydio Piza Fontes e Antonio Claudio Mariz de Oliveira, fizeram, nessa ordem, chamamento à defesa da Constituição Federal. “Faço apelo para que os magistrados cumpram a Constituição – e só. Que deixem a criação de leis a quem estabelece a própria Carta Magna”, disse Piza Fontes. Em seguida, Mariz de Oliveira ressaltou preocupação com uma possível ruptura institucional diante do cenário de insegurança jurídica. “A advocacia vai trabalhar para que essa ruptura, que sinto, não se concretize, mas, caso ocorra, estaremos mais uma vez na linha de frente para que continuemos uma democracia, um país de liberdade e de paz social”, finalizou Mariz. O olhar atento da advocacia ao funcionamento das instituições também foi destacado por Ruy Altenfelder Silva, presidente da Academia Paulista de Letras Jurídicas.
Defesa da Constituição
Durante o encontro, os participantes que corroboraram o ‘Manifesto em Defesa da Justiça’ lembraram que a Constituição Federal completa 30 anos. Marcos da Costa, inclusive, recordou que o Brasil vive o maior período democrático de sua história sob a égide destas diretrizes constitucionais.
Em meio aos discursos, mais presentes deixaram clara a preocupação com a estabilidade do país. “Todos os olhos estão voltados para o STF e o Poder Judiciário deve arbitrar a aplicação do Direito de forma serena e sem política. Todas as vezes que nos distanciamos milímetros do Direito, perdemos o rumo de desenvolvimento do país”, disse José Horácio Halfeld Ribeiro, presidente do IASP.
O alerta sobre o respeito à Constituição, tão em falta, foi diversas vezes reforçado. “Que a união de nossa classe se perpetue e possa ser exemplo para outras categorias”, disse Luis Otávio Camargo Pinto, presidente do SINSA. “Temos visto extrapolo de funções e agora embates que causam constrangimento. O movimento é legítimo e necessário diante de todo esse triste quadro”, concordou o presidente da OAB Acre, Marcos Vinicius Jardim Rodrigues.
Por sua vez, o presidente da OAB da Bahia, Luiz Viana Queiroz, destacou que defender a Justiça exige defender a Constituição. “Fazer a defesa da Justiça é dizer que o Supremo Tribunal Federal também está submetido à Constituição Federal. Tem a grandiosa missão de interpretá-la, de aplicá-la, mas sobretudo de respeitá-la. Quando o próprio Supremo Tribunal Federal diz que o que está escrito na Constituição não é bem aquilo que está escrito na Constituição, nós temos um problema constitucional. Quando o próprio Supremo Tribunal Federal diz que que presunção de inocência e trânsito em julgado não é o que sempre foi dito sobre presunção de inocência e trânsito em julgado, nós temos um problema. O Supremo destampou a Caixa de Pandora e abriu um processo constituinte ilegítimo. A Constituiçao Federal de 88 já foi reformada mais de 100 vezes, através do devido processo legislativo de emenda constitucional. É esta a forma de emendar a Constituição. Nem mesmo o Supremo Tribunal Federal pode emendar a Constituição através de suas intepretações" afirmou o presidente da OAB-BA. "O baiano João Mangabeira no livro "Ruy: o Estadista da República", afirma que Ruy teria dito: 'O Judiciário foi o poder que faltou à República'. Tenho a esperança de que este não seja o momento em que o Judiciário haverá de faltar à República", completou Luiz Viana.
Destacando que o STF é uma instância democrática que não legisla, Lívio Enescu, presidente da AATSP, fez duras críticas a outras posturas dos ministros, que considerou inaceitáveis, além das discussões que envolveram ofensas pessoais. “É inadmissível que um ministro diga que tem horário para sair em meio a uma sessão do Supremo”, disse. No último dia 22 de março, o Tribunal suspendeu os trabalhos porque um ministro teria de sair para um compromisso. “Façam o seu trabalho e tragam às ruas muita compreensão, fundamentação e respeito”, concluiu.
Manifesto em Defesa da Justiça
A Ordem dos Advogados do Brasil, Seção de São Paulo, a Associação dos Advogados de São Paulo, o Instituto dos Advogados de São Paulo, o Centro de Estudos das Sociedades de Advogados, a Associação dos Advogados Trabalhistas de São Paulo, o Movimento de Defesa da Advocacia, o Sindicato das Sociedades de Advogados dos Estados de São Paulo e Rio de Janeiro, a Academia Brasileira de Direito Criminal, a Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas, a Academia Internacional de Direito e Economia, a Academia Paulista de Letras Jurídicas e o Conselho Superior de Direito da Fecomercio manifestam, publicamente, a necessidade imperiosa da observância de preceitos constitucionais e legais, da segurança jurídica e da urbanidade com valores que devem nortear a Corte Suprema brasileira.
O Supremo Tribunal Federal é, para a Nação, a instituição depositária das esperanças de respeito aos valores maiores do Estado de Direito, da observância da Constituição brasileira e das leis, da preservação das garantias fundamentais da cidadania, e da prevalência de um Judiciário independente, isento de julgamentos pautados exclusivamente pelas preferências pessoais de seus membros, formadas sem influências externas e a partir do devido processo legal e do pleno exercício do direito de defesa.
A insatisfação com os rumos do País não autoriza o descumprimento da Lei e da Constituição Federal, tampouco autoriza definir novas regras, a não ser pelo processo legislativo articulado pelos representantes eleitos pelo Povo.
A fim de garantir que a harmonia e a independência sejam asseguradas, o constituinte tornou o Supremo Tribunal Federal o guardião da Constituição, mas proibiu-o de legislar, como se pode ler no artigo 103, § 2º da CF, pois nem na ação de inconstitucionalidade por omissão pode a Máxima Corte substituir o Poder Legislativo. Causa perplexidade assistir aos agressivos desentendimentos internos do órgão de cúpula do Poder Judiciário que acabam, indevidamente, reforçando o movimento de intolerância e arbítrio. É lamentável que a divergência de teses jurídicas possa despertar sentimentos e atitudes incompatíveis com a urbanidade e o respeito. Por sua relevante posição de guardiã da Constituição, na busca por assegurar direitos para que a sociedade construa um país mais fraterno, justo e democrático, esperamos que os integrantes da nossa mais alta Corte reencontrem o caminho da harmonia e do respeito de uns para com os outros e para com os brasileiros. Conclamamos por segurança jurídica, urbanidade e respeito à Lei, porque enfraquecer as Instituições da República e seus membros é um desserviço para a sociedade brasileira, que somente poderá retomar o seu rumo com os Poderes da República independentes e harmônicos entre si, fortalecendo a Democracia. Fonte: Com OAB-SP
A fim de garantir que a harmonia e a independência sejam asseguradas, o constituinte tornou o Supremo Tribunal Federal o guardião da Constituição, mas proibiu-o de legislar, como se pode ler no artigo 103, § 2º da CF, pois nem na ação de inconstitucionalidade por omissão pode a Máxima Corte substituir o Poder Legislativo. Causa perplexidade assistir aos agressivos desentendimentos internos do órgão de cúpula do Poder Judiciário que acabam, indevidamente, reforçando o movimento de intolerância e arbítrio. É lamentável que a divergência de teses jurídicas possa despertar sentimentos e atitudes incompatíveis com a urbanidade e o respeito. Por sua relevante posição de guardiã da Constituição, na busca por assegurar direitos para que a sociedade construa um país mais fraterno, justo e democrático, esperamos que os integrantes da nossa mais alta Corte reencontrem o caminho da harmonia e do respeito de uns para com os outros e para com os brasileiros. Conclamamos por segurança jurídica, urbanidade e respeito à Lei, porque enfraquecer as Instituições da República e seus membros é um desserviço para a sociedade brasileira, que somente poderá retomar o seu rumo com os Poderes da República independentes e harmônicos entre si, fortalecendo a Democracia. Fonte: Com OAB-SP