OAB-BA promove audiência pública para debater combate ao feminicídio
Com a participação de entidades públicas e da sociedade civil, evento foi realizado como parte da campanha da Seccional no combate à violência contra a mulher
Em continuidade à campanha de combate ao feminicídio, a OAB da Bahia promoveu uma audiência pública para debater ações e políticas públicas voltadas à prevenção da violência contra a mulher. O evento aconteceu na manhã desta segunda (22) e foi realizado de forma virtual pela ferramenta Zoom, com transmissão pelo YouTube.
A audiência contou com a participação da secretaria Estadual de Políticas para as Mulheres, Secretaria Municipal de Politicas para Mulheres, Tribunal de Justiça da Bahia, Defensoria Pública, Ministério Público, Secretaria de Estado de Segurança Pública e Defesa Social e movimentos e representantes da sociedade civil.
O evento foi aberto pelo presidente da OAB-BA, Fabrício Castro, que classificou o aumento da violência contra a mulher como algo "muito triste em meio à pandemia e que mostra o rosto da sociedade". "Neste sentido, a OAB da Bahia tem o compromisso de mudar essa realidade. Fizemos diversos eventos ao longo dos últimos dois anos para tornar nossa sociedade ainda mais justa", ressaltou.
A vice-presidente da Seccional, Ana Patrícia, destacou que o evento foi pensado para reafirmar "o compromisso da Ordem com o Estado do Direito e com as mulheres, reunindo forças de homens e mulheres em busca de uma mesma causa".
A secretária-geral da OAB-BA, Marilda Sampaio, disse que a sociedade tem sido tolerante com a violência contra a mulher e falou sobre a importância da união de forças. "Precisamos dar as mãos, porque a gente só vai conseguir vencer essa situação com o apoio de toda a sociedade e da advocacia nesse momento", ressaltou.
O secretário adjunto da Ordem, Maurício Leahy, destacou sua indignação em ainda ter que discutir temas como o feminicídio e lamentou o aumento de casos na pandemia. "No momento que já temos uma crise sem precedentes, assistimos à crescente violência dentro da própria casa das mulheres. É uma realidade absurda", lamentou.
O tesoureiro da Seccional, Hermes Hilarião, disse que "a OAB, mais uma vez, cumpre sua função constitucional de debater temas de interesse da sociedade e conscientizar os colegas que estão entrando nos quadros da Ordem".
Políticas de enfrentamento
O Tribunal de Justiça da Bahia (TJBA) também participou da audiência. Representando a instituição, a desembargadora Nágila Brito parabenizou a OAB-BA por discutir um tema "tão importante" e destacou sua indignação com os números.
“Entre 2017 e 2020, quase 80% dos crimes contra mulheres aconteceram dentro de sua própria casa e foram cometidos por companheiros. Em quatro anos, foram 374 mulheres mortas por parceiros, sem falar nas subnotificações. A Bahia, infelizmente, ostenta o terceiro lugar entre os estados que mais matam mulheres, ficando atrás, apenas, do Rio de Janeiro e São Paulo", denunciou.
Para tentar conter o avanço de casos entre a classe, o presidente da Caixa dos Advogados (CAAB), Luiz Coutinho, destacou o trabalho da CAAB no enfrentamento à violência contra a advogada. "Estamos criando uma frente para as advogadas em situação de agressão que contará com a ampliação do auxílio e um apoio jurídico e psicológico nesse momento de pandemia", pontuou.
Representando o Conselho Federal, a presidente da Comissão Nacional da Mulher Advogada, Daniela Borges, informou que o Brasil é o quinto país do mundo em número de feminicídio e "na Bahia a situação só piora".
A advogada também disse que "a violência contra a mulher não pode se normalizar nunca". "Enquanto indivíduos, precisamos de políticas públicas que promovam uma mudança de cultura", completou Daniela.
O coordenador das Comissões Permanentes e Especiais da Seccional, Adriano Batista, disse que "a construção de uma nova sociedade começa hoje".
Com opinião semelhante, o subcoordenador da mesma comissão, Victor Gurgel, destacou que o feminicício é um problema da humanidade e disse estar feliz com o engajamento dos homens na melhoria da sociedade.
À frente da Comissão da Mulher Advogada, Daniela Portugal destacou a importância do debate e da conscientização na mudança de postura de cada pessoa. "É com esse diálogo que a gente constrói a sociedade que deseja", reforçou.
Sobre a campanha desenvolvida pela Seccional, a presidente da Comissão de Proteção aos Direitos da Mulher da OAB-BA, Renata Deiró, disse que o objetivo é envolver a sociedade no combate ao femenicídio.
"A OAB-BA, como representante dos interesses da sociedade civil e alinhada com a Rede de Proteção aos Direitos da Mulher, tem como missão adotar ações efetivas na defesa das mulheres em situação de violência", disse Deiró.
Um feminicídio a cada 2 horas
Ainda em sua exposição, Renata fez uma apresentação das diretrizes da campanha da OAB-BA e destacou que a Lei Maria da Penha, apesar de bastante conhecida, ainda apresenta obstáculos em sua aplicação. "Para que ela seja melhor aplicada, precisamos que a mulher receba tratamento humanizado e respeitoso, seja na delegacia, no Instituo Médico Legal ou nos centros de assistência", reforçou.
Renata também trouxe dados de violência contra a mulher, que apontam para um registro de estupro a cada 8 minutos, 536 agressões por hora, um feminicídio a cada 2 horas e um registro de violência doméstica a cada dois minutos. "E, infelizmente, não temos uma quantidade suficiente de delegacias para amparar e proteger essas mulheres", lamentou.
Diante deste cenário, a secretária Municipal de Politicas para Mulheres, Infância e Juventude, Fernanda Lordelo, apontou a união de forças como uma alternativa para mudar a realidade. "De fato, existem situações como essa que precisam ser dialogadas para que possamos decidir como apoiar a rede de mulheres", disse.
A representante da Defensoria Pública da Bahia Lívia Silva Almeida disse que a violência doméstica é um fenômeno que atinge todas as mulheres, sobretudo as mulheres negras, de forma mais drástica.
Lívia também destacou a importância do debate de medidas educativas ligadas à Lei Maria da Penha. "Quando a gente fala nesta lei, falamos com um viés unicamente punitivista. É muito importante destacar seu viés educativo e preventivo também", observou.
A representante do Ministério Público Lívia Vaz disse que são muitos os desafios. "Mas um desafio principal é começar a mudar nossa política institucional, discutindo o machismo e o patriarcado internamente e centralizando e unificando as informações das nossa instituições", disse.
O secretário de Estado de Segurança Pública e Defesa Social, André Garcia, trouxe dados relativos à Bahia e à capital. "Até agora, em 2021, tivemos 18 feminicídios no estado. Em Salvador, tivemos 3", informou.
A secretária Estadual de Políticas para as Mulheres, Julieta Palmeira, apresentou um projeto estadual de conscientização referente à violência contra a mulher e disse que o Brasil vive diversas crises - sanitária, humanitária e econômica -, que, junto à pandemia, colocam a questão da mulher em situação ainda mais grave.
Neste contexto, Julieta disse que é preciso que a Rede de Apoio às Mulheres esteja em alerta. "Temos que ter a possibilidade de levar em conta que são serviços essenciais, ainda que existam medidas restritivas", pontuou.
"Nem pense em me matar"
Representando as entidades da sociedade civil, Vilma Reis, ativista do Coletivo Luiza Mahin, falou sobre o lançamento do manifesto "Nem pense em me matar", que denuncia o aumento de feminicídio no país.
"Diante de tantos assassinatos, a maioria diante dos filhos, articulamos a campanha com mais de 200 organizações feministas. Nossa intenção é que essas mulheres sejam acolhidas em todas as delegacias da Bahia e na rede de enfretamento à violência contra a mulher", destacou.
A deputada estadual Olívia Santana falou sobre a importância da "quebra de silêncio de mulheres que estão amargando os efeitos da pandemia". Olívia também destacou a necessidade da criação de um fundo de enfrentamento à violência e feminicídio. "É uma medida concreta e urgente, que não pode mais ser adiada", cobrou.
A diretora de Políticas para Mulheres de Salvador, Fernanda Cerqueira, disse que a questão do feminicidio necessita de um olhar de prevenção e destacou a atuação da secretaria na atenção à mulher.
A representante Marina Duarte lamentou a situação que vive a sociedade brasileira, sobretudo a mulher negra. "Ela é a que mais sofre, a que mais morre e a que tem mais direitos retirados. O número chega a ser três vezes maior", lamentou.
O evento contou, ainda, com a fala da presidente da Comissão Especial de Combate à Intolerância Religiosa da OAB-BA, Maíra Vida. A advogada falou sobre a campanha "Tem Gente com Fome", que conta com ações de combate à fome da mulher no atual contexto de isolamento.
"Infelizmente, na pandemia, tivemos um agravemnto do empobrecimento das mulheres. Então, para combater a fome e lutar pelo auxílio emergencial e outras medidas voltadas às mulheres, nos unimos à campanha", concluiu Maíra.