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Cumprir a Meta 2 tornará a Justiça mais eficiente

Por Vladimir Passos de Freitas

Coluna Vladimir - Spacca

No dia 4 de agosto de 2009 o Conselho Nacional de Justiça e os corregedores-gerais do CNJ, da Justiça Federal e da Justiça do Trabalho, baixaram a Resolução Conjunta 1, cujos objetivos são os de descongestionar o Poder Judiciário de primeiro e segundo graus e alcançar a Meta de Nivelamento 2, estabelecida no II Encontro Nacional do Judiciário, ou seja, julgar todos os processos distribuídos até 31 de dezembro de 2005.

Referida resolução é algo absolutamente novo na história do Poder Judiciário do Brasil. Em um primeiro momento recomenda que juízes e servidores de varas que estejam com o serviço em dia auxiliem em outras que se achem congestionadas. Até aí, nada de novo. Os chamados “mutirões” ou “regimes de exceção” são praticados desde os anos 1980. A novidade está no fim do artigo 1º, “b”, que diz: “... inclusive nos feitos de jurisdição federal delegada, acaso solicitado pela Justiça Estadual”. A que se referem estas 12 palavras?

A Justiça Federal não está em todo o território nacional. Mesmo com o seu crescimento e interiorização. Por isso, algumas ações podem ser processadas perante a Justiça Estadual. Assim é e assim sempre foi. Quando o Decreto 848, de 11.10.1890, introduziu a Justiça Federal no Brasil, o artigo 16 já previa a delegação de competência à Justiça local, desde que as partes estivessem de acordo.

Atualmente, a matéria está prevista no artigo 109, parágrafo 3º, da Constituição, que prevê a possibilidade de ações de natureza previdenciária serem processadas na Justiça Estadual, com recurso ao TRF da Região. Admite também que a lei crie outras hipóteses, como é o caso das execuções fiscais propostas pela Fazenda Nacional nas Comarcas da Justiça Estadual.

Pois bem, o que o artigo 1º, “b”, da Resolução Conjunta 1/2009 fez foi permitir que se houver solicitação da Justiça Estadual ao TRF da Região, poderão ser designados juízes e servidores federais para auxiliar nas ações de competência delegada.
Esta iniciativa é corajosa e rompe com mais de 100 anos de tradição. Avança onde raramente alguém tem coragem de avançar. E o faz com o único objetivo de agilizar a Justiça. O que ela quer dizer, na simplicidade que se exige para a boa compreensão, é que nos Juízos de Direito onde as ações de competência delegada (leia-se previdenciárias contra o INSS e execuções fiscais federais) estiverem tendo andamento lento, a Justiça Federal poderá, se solicitado, prestar auxílio.

Uma visão mais conservadora poderá lançar severas críticas à novidade. Dir-se-á que os corregedores estaduais não participaram da resolução e que essa intervenção significa ofensa ao princípio do juiz natural. A meu ver, sem razão. Vejamos.
A resolução tem méritos. E o primeiro deles é querer resolver o problema do atraso na prestação jurisdicional. Seus subscritores poderiam manter-se nos antigos e cansativos chavões: “há muito serviço, precisamos de mais Varas”. Mas, ao contrário, inovaram. Arriscaram-se. Evidente, pois alguém poderá invocar até a inconstitucionalidade do ato administrativo.

Feito este necessário registro, vejamos a ausência de participação dos corregedores-gerais de cada estado. Temos 26 estados e o Distrito Federal, portanto, 27 corregedores-gerais da Justiça Estadual, mais 5 dos TRFs e 24 dos TRTs. Pretender que todos comparecessem e aderissem a inovação deste tipo é querer o impossível. Mas qual o prejuízo da ausência desses magistrados? Nenhum, já que o auxílio (não intervenção) dos juízes e servidores federais só se dará se a Justiça Estadual solicitar.

O segundo argumento – ofensa ao princípio do juiz natural – é mais sério. Como ensina Célia Maria Daniel Silva, “a concepção do princípio do juiz natural foi originariamente construída no Direito anglo-saxão baseada na proibição de que as infrações penais fossem processadas e julgadas sem o crime estar previamente definido e o seu julgamento adstrito a um tribunal anteriormente estabelecido” (http://www.direitonet.com.br/, acesso em 8.8.2009).

O que se quer com este princípio, consagrado no artigo 5º, inciso LIII da Constituição Federal, e que vale para o crime e para o cível, é proteger a parte de um juiz escolhido, parcial. O filme “Sessão Especial de Justiça”, do diretor Costa Gravas, relata caso típico de Tribunal de exceção criado na França, durante a 2ª Grande Guerra Mundial, para julgar os contrários à dominação nazista. No Brasil, o exemplo clássico é o Tribunal de Segurança Nacional, criado em 1936 (vide “Pouco se sabe do Tribunal de Segurança Nacional”, www.conjur.com.br, 31.5.2009).

Pois bem, esse auxílio, se vier a efetivar-se, não ofende o referido princípio, pela simples razão que o juiz natural é o federal. O Juízo Estadual atua por exceção, a título de colaboração e sem qualquer vantagem econômica. Se a jurisdição é delegada e o órgão delegante vem a exercê-la a pedido do delegado, repita-se, não se pode ver aí qualquer nulidade ou ofensa ao princípio do juiz natural. O único objetivo é o de agilizar a Justiça e não de introduzir um julgador parcial.

O princípio do juiz natural é importantíssimo e deve ser utilizado para coibir práticas que violem a imparcialidade do juiz. Mas não se pode dar a ele um entendimento extremado e irreal, que acabe indo contra a própria administração da Justiça.
À vista do afirmado, resta esperar que os Juízos Estaduais, em que as ações de competência delegada se encontrem em situação de grave congestionamento, provoquem a cúpula de seus tribunais, solicitando a aplicação da Resolução Conjunta 1/2009 do CNJ. Quem sabe, até provocados pelas subseções da OAB. Com isto, os autores das ações previdenciárias ou os credores de débitos fiscais federais terão direito ao julgamento em prazo razoável, como assegura a Constituição Federal no artigo 5º, inciso LXXVIII. 

A união de esforços será um importante passo no amadurecimento das relações institucionais (TJs e TRFs) e no aprimoramento do Judiciário brasileiro. Tornar efetiva a Resolução Conjunta 1/2009 é tarefa de todos que sonham com uma Justiça eficiente.