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CNJ recomenda prioridade para conflitos de terra

 O Conselho Nacional de Justiça aprovou, nesta quarta-feira (4/3), a Recomendação 22 estipulando que tribunais e varas de Justiça passem a priorizar ações que envolvem conflitos de terra. De acordo com o conselho, a atitude foi tomada em razão das inúmeras ações pendentes sobre o tema.

O presidente do CNJ e do Supremo Tribunal Federal, ministro Gilmar Mendes, explicou que a iniciativa é em razão aos diversos conflitos que vêm acontecendo no país. Ele disse que essa prioridade não deve atrapalhar o percurso dos demais processos. “Temos que sempre eleger prioridades. Esta é uma questão que está se acumulando, que está se adensando, e que muitas vezes gera, maximiza conflitos”, afirmou em entrevista coletiva.

O papel do órgão será acompanhar processos relacionados com conflitos agrários, para que seja priorizado o monitoramento permanente dessas causas, que envolvem problemas de reintegração, desapropriação e os crimes em decorrência desses conflitos.

“Queremos priorizar o julgamento dessas causas de modo a não ter essas acusações de que os processos terminam sem uma dinâmica própria e que, por isso, talvez gere um quadro de impunidade de não resposta por parte do Judiciário”, completou o ministro.

Votação no CNJ

Ao votar a questão no CNJ, houve empate, seis votos contra e seis a favor. O corregedor-nacional de Justiça, ministro Gilson Dipp, que presidia a sessão, desempatou a votação e aprovou a recomendação. Os membros favoráveis foram: conselheiro-ministro João Oreste Dalazen, o relator Jorge Maurique e os e os conselheiros Andréa Pachá, Mairan Maia, Antonio Umberto de Souza Junior e Altino Pedrozo. Votaram contra a decisão os conselheiros Felipe Locke, José Adonis Callou de Araújo Sá, Paulo Lobo, Marcelo Nobre, Técio Lins e Silva e Rui Stoco.

Questionado na entrevista coletiva sobre o empate na votação, o presidente do CNJ, Gilmar Mendes, disse que isso não é expressivo. “Porque, a rigor, é uma resolução do Conselho. Sete a seis, cinco a quatro, unanimidade – é uma resolução do Conselho.” Também foi levantada a possibilidade de incorporação, ao texto da recomendação, da necessidade de criação de varas agrárias. A proposta ainda será discutida.

Conflito agrário e o Judiciário

Na última quarta-feira (25/2), Gilmar Mendes criticou as invasões de terras em São Paulo e Pernambuco organizadas pelo Movimento Sem Terra durante o carnaval e cobrou uma atuação do Ministério Público para verificar se existe financiamento público a estes movimentos.

Nesta terça-feira (3/3), o procurador-geral da República, Antonio Fernando Souza, afirmou que os casos de repasse devem ser analisados e não condenados como crime. Souza criticou o comentário feito por Gilmar Mendes sobre a atuação do MP nos conflitos.

Em resposta, o presidente do STF declarou: “Eu disse o óbvio, que de fato esta é uma matéria de competência do MP. É do Tribunal de Contas, também. Em parte, é do Judiciário, quando recebe as reclamações. Eu não fui cuidar de um ou de outro caso, e depois de uma semana ele apresentou uma lista de casos”. De acordo com ele, não podem demorar com as ações, senão, ”daqui a pouco nós vamos ficar celebrando o quê? Missa de sétimo dia, missa de trigésimo dia, missa de um ano. Nós estamos falando de mortes”.

Sobre legalidade dos repasses oferecidos pelo governo a organizações ligadas ao MST, Gilmar acrescentou que é bom o MP fazer a distinção – de quando o repasse é legítimo e quando não é. “Mas é preciso haver decisão. Porque, do contrário, por exemplo, nós estamos já dois anos do fim do governo Lula. Essas investigações vão ser feitas para o próximo governo? As medidas de suspensão? É só para isso. Tem que haver medidas efetivas, só isso. Mas não há nenhuma contraposição. Acho que nós estamos de acordo.” Com informações da Assessoria de Imprensa do STF e da Agência CNJ de Notícias.

O senhor pode explicar, na prática, o que significa essa recomendação do CNJ?
Gilmar Mendes – O CNJ decidiu – tendo em vista a importância do assunto, a gravidade –, que seria importante que os tribunais fizessem um acompanhamento rigoroso e informassem, inclusive, ao CNJ, sobre os processos relacionados com conflito agrário – problemas de reintegração, desapropriação, os casos ligados a crimes decorrentes desse conflito. Foi essa a decisão. Nós vamos criar um grupo de trabalho aqui no âmbito do CNJ para acompanhar e manter uma interlocução com os vários tribunais sobre o assunto. Priorizar o julgamento dessas causas, de modo a não ter essas acusações de que os processos quedam sem uma dinâmica própria e, por isso, talvez gerassem um quadro de impunidade, de não-resposta por parte do Judiciário. Então, é um esforço que nós estamos fazendo nesse sentido.

A recomendação não deixa claro como os tribunais vão informar ao CNJ essas informações. Vai haver alguma metodologia?
Gilmar Mendes – Nós estamos desenvolvendo, de forma geral, via controle informático. Isso é detalhado no âmbito do próprio CNJ, como estamos fazendo com os processos criminais, com a questão da execução criminal – criamos mecanismos online de comunicação.

Vai ser mensal?
Gilmar Mendes – Isso vai ser estabelecido de forma adequada. Mas, em geral, estamos trabalhando com controles informáticos.

E os outros processos? Ficam para trás?
Gilmar Mendes – Na verdade, temos que sempre eleger prioridades. Esta é uma questão que está se acumulando e que muitas vezes maximiza conflitos. Daí a necessidade de que nós tomemos essas iniciativas. É claro que temos várias prioridades que estão sendo eleitas: a questão do menor, as questões criminais – que estamos fazendo esse acompanhamento todo. Mas estamos focando também nisto. Estamos fazendo, por exemplo, inspeções e também as audiências públicas em vários desses estados que estão envolvidos nesses embates. No Amazonas, acabamos de realizar uma audiência. No Pará, estivemos lá e estamos acompanhando, de modo que nós estamos nos integrando nesse esforço.

 Qual a opinião do senhor sobre as declarações do procurador-geral da República?
Gilmar Mendes – Não cuidei disso. Quais são as declarações?

Por exemplo, ele falou que talvez tenha havido falta de informação quando o senhor falou que o Ministério Público deveria agir e que o MP já estaria investigando os repasses ilegais para as entidades de sem-terra.
Gilmar Mendes – Eu disse o óbvio, que de fato esta é uma matéria de competência do MP. É do Tribunal de Contas, também. Em parte, é do Judiciário, quando recebe as reclamações. Eu não fui cuidar de um ou de outro caso, e depois de uma semana ele apresentou uma lista de casos. No momento, talvez ele também não soubesse. Agora, claro que nós não podemos esperar essas decisões. Porque, do contrário, daqui a pouco nós vamos ficar celebrando o quê? Missa de sétimo dia, missa de trigésimo dia, missa de um ano. Nós estamos falando de mortes.

 Ele disse também que não pode ser considerado sempre um crime o repasse de recursos públicos para movimentos que invadem uma terra pública ou privada. Não pode ser considerado automaticamente um crime.
Gilmar Mendes – É bom que haja, então, uma atuação do MP fazendo essa distinção – de quando o repasse é legítimo. Ele vai nos ensinar em relação a isso. Mas é preciso haver decisão. Porque, do contrário, por exemplo, nós estamos já dois anos do fim do governo Lula. Essas investigações vão ser feitas para o próximo governo? As medidas de suspensão? É só para isso. Tem que haver medidas efetivas, só isso. Mas não há nenhuma contraposição. Acho que nós estamos de acordo.

No CNJ, houve um voto de minerva do ministro Gilson Dipp. Com relação a essa recomendação, houve uma divisão.
Gilmar Mendes – Isso não é expressivo. A rigor, é uma resolução do Conselho. Sete a seis, cinco a quatro, unanimidade – é uma resolução do Conselho.

 O senhor falou em missa de sétimo dia, missa de um mês e se essas investigações serão feitas para o próximo governo. O senhor acha que o MP está indo devagar nas investigações?
Gilmar Mendes – Não vou emitir juízo. Só estou apontando para a gravidade de determinados fatos – quando eu falei aquilo na quarta-feira de cinzas, nós estávamos a falar diante de múltiplas invasões, e de quatro casos de morte. É nesse contexto que nós temos que considerar. Agora, se esse movimento é subsidiado por recursos públicos – que não é recurso do governo, temos o equívoco de falar isso, mas esse recurso é seu, é meu. Será que nós, na sociedade, queremos pagar isso?

A recomendação fala em um número elevado de processos. Já se tem um levantamento?
Gilmar Mendes – Exatamente por isso estamos fazendo [esse levantamento]. Hoje, por exemplo, conversei com alguns presidentes de tribunais, ontem conversei com o presidente do tribunal de Pernambuco – e eles estão já fazendo esse levantamento. Aí surgem escaramuças internas, há decisão judicial, mas a polícia não tem força suficiente para cumprir. Então há todos esses problemas. E isso tudo está sendo olhado, nós já estamos visitando muitos desses estados, os senhores sabem, nós estamos fazendo inspeção e vistoria, e este passa a ser um dos temas, um dos focos das nossas ações a partir dessa recomendação do CNJ.

Como é uma recomendação, em teoria, o tribunal que não quiser eleger isso como uma prioridade e criar mecanismos concretos de controle não precisa fazer.
Gilmar Mendes – Isso não tem acontecido. [Os tribunais] têm acatado.

O senhor viu uma nota do MST do Pará, que faz referência ao fato de invasões em fazendas do empresário Daniel Dantas, em que eles falam que terras vendidas para banqueiros que são soltos pelo mesmo ministro que faz acusações contra o movimento.
Gilmar Mendes – [Daniel Dantas foi] solto pelo Supremo Tribunal Federal. Decisão do Plenário, nove votos a um, decisão do STF.