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Blog: Risco de perpetuar pessoas em lugar de ideias

Aracaju(SE), 05/06/2009 - A matéria "Risco de perpetuar pessoas em lugar de ideias" foi publicada hoje (05) no blog do jornalista Jozailto Lima, diretor de jornalista do jornal Cinform, de Aracaju:

"É impressionante como desagrada ao país inteiro a defesa que o deputado federal Jackson Barreto, PMDB-SE, faz da Proposta de Emenda à Constituição - PEC - permitindo que seja dado direito ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva de concorrer a um terceiro mandato. Desagrado que vai do próprio presidente Lula, que seria o beneficiado por este direito casuístico, à grande parte do PT, passando por instituições de peso da sociedade civil, como a Ordem dos Advogados do Brasil - OAB -, desembocando em gente como José Dirceu e chegando à consciência de um vereador do interior de Sergipe, como Olivier Chagas, do PT de Itabaiana.

"Um terceiro mandato acaba com a alternância e desiguala a concorrência. O terceiro mandato parte de um outro pressuposto - e um pressuposto equivocado: o de que as pessoas valem mais do que as ideias. E se as pessoas valessem mais do que as ideias, nós teríamos que perpetuar as pessoas e não as ideias", disse a esta coluna o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, o sergipano Cezar Britto.

Colocar as pessoas acima das ideias enseja ainda um outro risco, alerta Cezar Britto. "Isso nos remeteria à seguinte linha de raciocínio: enquanto as pessoas importantes existirem, elas devem permanecer nos cargos por uma, duas, três, quatro, cinco ou seis vezes, ou enquanto vivas estiverem. Esta seria mais uma regra para a Monarquia do que para a República. E a República, além de ter sido abraçada pela Constituição, foi ratificada no plebiscito de 1993", diz.

O presidente da OAB entende que ao apresentar a PEC do terceiro mandato e sair por aí defendendo-a, o deputado federal Jackson Barreto repete um traço nacional ruim. "Acho que ele reproduz parte de uma cultura brasileira que acha que na ausência de partidos fortes deve-se apostar mais nos homens do que nas estruturas. Mas eu entendo que é um pensamento que não deve ser estimulado na democracia brasileira", afirma Cezar.

Cezar Britto acredita, no entanto, que o Brasil não corre o risco de materializar mais este casuísmo. A esperança dele vem da postura do próprio presidente Lula, que tem manifestado desinteresse na proposta de Jackson. "Eu já conversei com o presidente Lula sobre o assunto e ele me afirmou que não vai para uma terceira eleição. No que ele faz bem, porque a democracia pressupõe a alternância e a igualdade de concorrência. Já questionei a ele sobre isso, e ele me disse que não é e nem pretende ser candidato. E eu acredito no que ele diz. Isto é reforçado por vários ministros. E para acreditar no que diz o presidente, acrescento um outro argumento: o de que Lula hoje é uma referência mundial, como é Nelson Mandela, ex-presidente da África do Sul. Se ele for para um terceiro mandato, se aproximará mais de um político de uma República de Banana do que de um presidente de um país estruturado", diz Britto.

Na semana antepassada José Dirceu, ex-ministro da Casa Civil, ex-deputado federal por São Paulo e um petista de notoriedade nas sombras, escreveu e distribuiu aos meios de mídia nacionais um artigo polêmico, chamado ‘Duas Táticas?'', no qual ele, pragmaticamente, condena a tese do terceiro mandato por traduzir, como diz o título do artigo, mais de uma estratégia para o jogo presidencial em curso. "Numa disputa presidencial não se pode ter duas táticas. Não tem como construir uma candidatura, a de Dilma Rousseff, e ao mesmo tempo começar a seguir outra tática, a do terceiro mandato do presidente Lula. Mesmo que essas iniciativas pró-terceiro mandato não tenham apoio ou sustentação no Congresso Nacional, que sejam posições individuais de parlamentares de alguns partidos, sem apoio de suas direções e lideranças, não devemos subestimar o prejuízo que podem provocar à pré-candidatura de Dilma Rousseff e ao PT. É preciso pôr um fim e impedir o prosseguimento desse movimento enquanto é tempo, antes que comecemos a trilhar um caminho sem volta - o das duas táticas, esta sim, uma rota segura para a derrota".

Como a condenação das ‘duas táticas'' parece soar unânime, o vereador de Itabaiana, Olivier Chagas, PT, dá seu chute na PEC de Jackson, mas com uma visão menos pragmática do que a de Zé Dirceu, e mais densa de preocupação institucional. "Se a tese do terceiro mandato fosse do PSDB eu estaria dizendo que era golpe, porque seria casuísmo. Mas é também quando vem de alguém do nosso campo. Não cabe mudar a regra do jogo durante o jogo. Fere o regime democrático. Seria um precedente muito perigoso. Agora é conveniente para o PT. E mais tarde, quando a gente estiver fora do poder? Eu sou contra", diz ele. Há uma grande probabilidade de Jackson Barreto terminar pagando um preço amargo por este pato da PEC.

PS - O projeto dele foi lido no plenário da Câmara na última quinta, com 183 assinaturas de um quórum mínimo de 171, mas a Presidência da Casa lhe devolveu na sexta: 17 deputados do DEM e do PSDB retiraram seus nomes, reduzindo o quórum a 166. JB, no entanto, pode insistir na ideia, buscando novas assinaturas - e ele já garantiu que fará exatamente isto. O espetáculo de barbárie, portanto, vai continuar.