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Artigo Márcia Melaré: Medidas efetivas da OAB

O artigo a seguir, sob título "Direitos Humanos, Controle do Poder Judiciário — Medidas Efetivas da OAB", é de autoria da advogada Márcia Machado Melaré, secretária-geral adjunta do Conselho Federal da OAB.

Importante tem sido a atuação da nossa entidade, a OAB, no que diz respeito aos Direitos Humanos sob o controle do Poder Judiciário.

Preambularmente há de se pontuar que, para a Ordem dos Advogados do Brasil, um Judiciário forte e uma Justiça eficiente pressupõem uma Advocacia independente, respeitosa e respeitada, seja ela de caráter privado ou público.

Em qualquer parte do mundo, justiça ineficiente é sinônimo de impunidade, e esta, por sua vez, alimenta o descrédito nas instituições, em uma perigosa sucessão de quebra de valores que leva invariavelmente ao caos.

Portanto, para dar curso ao projeto de desenvolvimento, o Brasil precisa dessa conjugação de valores nas carreiras jurídicas, o que faz da advocacia uma protagonista para garantir segurança e estabilidade ao progresso do nosso País.

A Constituição Federal de 1988 representou um pacto do povo brasileiro que aspirava a um Estado democrático fundamentado, essencialmente, na dignidade da pessoa humana, condição indispensável para a construção de uma "sociedade livre, justa e solidária", nos exatos dizeres da Lei Maior.

Desde então, há uma crescente conscientização do exercício da cidadania; Um despertar para a efetivação de atos significativos da democracia participativa; Uma comunhão de interesses e ações no escopo de organizar a sociedade civil para que possa ser a edificadora de sua própria história.

Temos consciência de que à sociedade interessa o bem-estar, o crescimento econômico com respeito à natureza, à educação, à saúde, ao trabalho e ao convívio fraterno entre as pessoas, mas também lhe interessa a segurança jurídica que se traduza na paz social e na estabilidade.

Os Direitos Humanos, por sua vez, se amoldam de tal forma no ideário da Ordem dos Advogados do Brasil que seria impossível traçar uma linha histórica sem lançar mão de seus princípios universais.

Não é por menos que o advogado, humanista por ideal, tornou-se modelado para servir ao seu semelhante nas necessidades básicas de defesa, proteção, equilíbrio e preservação desses direitos.

E a OAB construiu sua ética política em coragem, lutas e riscos, por isso está entre as instituições mais respeitadas e vanguardeiras dos movimentos populares, credenciando-se na confiança do povo brasileiro e transmudando-se em sua voz.

A OAB tem missão corporativa e institucional; e institucionalmente, é militante contumaz dos Direitos Humanos, possuindo cada uma das suas 27 Seccionais Estaduais da OAB a sua própria Comissão de Direitos Humanos.

Vale lembrar que foi em nome da Declaração dos Direitos Humanos que a OAB se posicionou e lutou contra o arbítrio, a tortura nas prisões, a perseguição e o exílio de cidadãos, entregando a vida de seus advogados nesse combate. É essa consciência da universalidade dos Direitos Humanos que sempre nos fez atuar de forma eficaz às pessoas oprimidas, feridas e humilhadas. E continuamos a fazê-lo, pois o que mais nos motivaria quando abraçamos a vitoriosa causa para que o Supremo Tribunal Federal reconhecesse a constitucionalidade da Lei Maria da Penha?

Não se pode falar em igualdade de gêneros enquanto esta chaga da violência contra a mulher continuar exposta em nosso País. A Lei Maria da Penha aumenta o rigor das penas e possibilita a prisão preventiva dos agressores, e se tornou uma referência internacional, segundo estudos das Nações Unidas. Atualmente é considerada uma das três melhores legislações sobre a matéria violência doméstica em todo mundo.

Afirmando a necessidade de proteção especial da mulher brasileira, indispensável à consecução de uma igualdade material, e não apenas formal com o homem, a OAB Nacional ingressou na Ação Direta de Inconstitucionalidade argüida em face da Lei Maria da Penha, que se processava junto ao Supremo Tribunal Federal, como amicus curiae , para defendê-la.

O julgamento foi acalorado e prevaleceu, por unanimidade, não ser a lei inconstitucional e, também, que a ação não está condicionada unicamente à representação da vítima, podendo o Ministério Público apresentar denúncias sobre a violência perpetrada.

Como bem pontuou o Ministro Ricardo Lewandowski, na ocasião, as mulheres, como as estatísticas comprovam, não representam criminalmente contra o companheiro ou marido em razão da permanente coação moral e física que sofrem e que inibe a sua livre manifestação de vontade, a demandar a necessidade de ação do Ministério Público nesse sentido.

A Ministra Carmem Lúcia deixou clara a sua posição de que em briga de marido e mulher deve-se, sim, meter a colher, quando afirmou que é dever do Estado adentrar ao recinto das quatro paredes, quando na relação conjugal que se desenrola , houver violência.

Ainda em defesa dos direitos humanos, esteve o Conselho Nacional da OAB presente na sessão do Supremo Tribunal Federal, como amicus curie, sustentando a constitucionalidade da reserva de vagas em universidades a partir de critérios raciais.

O Presidente Ophir Cavalcante Junior afirmou, da tribuna, que: "O Brasil é uma sociedade de paz, que quer crescer cada vez mais, e esta é uma oportunidade que o STF tem de resgatar um débito histórico com a raça negra."

Citando dados de Instituto de Pesquisa, o Presidente demonstrou que, historicamente, o negro no Brasil não teve as mesmas oportunidades que os brancos, sendo que a população negra representa hoje 70% dos brasileiros pobres, sem acesso à educação de qualidade. "As políticas afirmativas para o equilíbrio das relações sociais tendem a diminuir as desigualdades e resgatar a dignidade da pessoa humana", afirmou Ophir.

A OAB esteve, também, fortemente empenhada na promulgação da denominada Lei da Ficha Limpa, que impede a candidatura de políticos condenados pela Justiça.

Nossa iniciativa junto ao Supremo Tribunal Federal foi fundamental para que a sua aplicação, já nas próximas eleições, possa promover uma abrangente assepsia no cenário eleitoral e retirar de cena alguns atores que em nada enobrecem a arte de fazer política.

Estamos empenhados também para a aprovação, pelo CNJ, de uma Resolução no sentido de proibir a nomeação ou designação para cargos comissionados, no Poder Judiciário, de pessoas condenadas por atos previstos como causas de inelegibilidade na Lei da Ficha Limpa. Trata-se de medida que atende ao anseio da sociedade e contribuirá para moralização do Judiciário.

Foi promoção da Ordem dos Advogados do Brasil o maior e mais fecundo debate sobre o papel do CNJ já realizado até hoje. E o CNJ saiu fortalecido ao ser reconhecida sua competência para julgar infrações ético-disciplinares dos magistrados, independentemente das corregedorias estaduais.

Outro movimento com o qual estamos comprometidos diz respeito aos pagamentos dos precatórios. Somente em São Paulo, mais de 40 mil pessoas esperam na fila do Tribunal de Justiça por um simples despacho. O número oficial declarado do calote promovido pelo Estado é de R$ 87 bilhões, mas estima-se algo bem acima de R$ 100 bilhões.

A OAB espera que Judiciário se imponha nessa questão, que estabeleça sanções capazes de provocar uma mudança no comportamento ético dos governantes. Nunca é demais lembrar que a Justiça faz parte da cesta básica da cidadania, da mesma forma como saúde, transporte, educação, segurança e outros bens constitucionais.

O desrespeito do Estado brasileiro no pagamento de seus débitos deixou de ser uma questão jurídica e passou a ser uma questão de violação aos direitos humanos. Não por menos, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil estuda levar o caso, em forma de denúncia, à Comissão Interamericana de Direitos Humanos, da Organização dos Estados Americanos (OEA), onde já estão, aguardando análise, outras cinco denúncias envolvendo a falta do pagamento de precatórios por entes públicos no Brasil.

Esses pontuais exemplos demonstram o entusiasmo e a combatividade de nossa entidade na defesa dos postulados dos Direitos Humanos, fatores que têm legitimado a OAB a representar a sociedade civil sempre que está em causa o interesse da cidadania.

Mas precisamos avançar mais, discutir mais, extirpar de vez contra qualquer tipo de discriminação que contrarie uma das constituições mais cidadãs em todo o mundo. A impunidade, saúde e educação precárias, trabalho escravo, desigualdades persistentes ainda são situações presentes no Brasil que devem ser combatidas.

A OAB juntamente com todas as instituições representativas da sociedade civil conseguirá fazer valer os direitos do homem — civis, sociais e políticos — aqui compreendido o gênero humano, independente de raça, sexo, credo e ideologias.