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Artigo: A missão histórica da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB)

Criada no cenário pós-Revolução de 1930, a Ordem dos Advogados do Brasil, filha combativa do Instituto dos Advogados do Brasil, cresceu acima de homens e logo se firmou como uma instituição de grandeza na República que buscava consolidação.
Seguiu vigilante diante da Assembléia Nacional Constituinte de 1934 que buscava a reconstitucionalização do país após a “Revolução Constitucionalista”, em um cenário mundial de fortalecimento de regimes fascistas.  
A Lei de Segurança Nacional trouxe adrede o Tribunal de Segurança Nacional subordinado ao Poder Executivo. Em tal cenário a Ordem aprofundou sua luta em defesa das liberdades democráticas e dos direitos humanos diante das primeiras medidas da execução do estado de sítio e da Lei de Segurança Nacional, que desembocariam no autoritário Estado Novo, em 1937 e, dentre outros, no episódio das prisões de Luís Carlos Prestes, Olga Benário, Harry Berger (Arthur Ewert) e Elise Ewert, após a Intentona Comunista, seguindo-se um período de intensa repressão e arbítrio, cenário no qual se notabilizaram grandes advogados, a exemplo dos inesquecíveis Sobral Pinto e Evandro Lins e Silva, o primeiro deles, indicado pelo Conselho Federal da OAB para defesa dos líderes comunistas Luís Carlos Prestes e Harry Berger, travando por nove anos, duras batalhas em defesa da liberdade e contra a violência do regime, apelando, inclusive, para a lei de proteção dos animais, na tentativa de resguardar a integridade física dos presos políticos.
Durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), a Ordem seguiu em seu papel altaneiro em defesa da democracia e comprometida com o interesse público primário, ou seja, de toda a sociedade, mesmo com a posição ambígua do governo brasileiro em relação à guerra, exigindo uma definição que somente ocorreu no âmbito formal, após o episódio do afundamento de cinco navios brasileiros provocados por submarinos alemães, entre 5 e 17 de agosto de 1942.
Após o restabelecimento das estruturas democráticas, a constante turbulência do cenário político exigiu a sempre firme participação da OAB diante de abusos cometidos contra advogados em todo o país, além da luta contra ameaças de outrora contra a sua autonomia e que, vez por outra, retornam à baila produzidas por detratores incomodados com a atuação rigorosa da Ordem contra privilégios e abusos.
O Golpe Militar de 1964, com o cenário rubro e cinzento apontado para as liberdades públicas, fulminou as bases democráticas que se sonhou construir no Brasil e nesse instante a OAB assumiu relevância sem par na defesa dos direitos humanos e da dignidade da pessoa, ao lado da ABI e da CNBB, sofrendo na carne, com a prisão política, inclusive, de integrantes dos seus quadros.
Seguiu-se à Anistia após os anos de chumbo e a interlocução da OAB afigurou-se essencial à sua decretação. A luta pela redemocratização do país seguia com focos obscuros criados pela ditadura militar, com atentados com o intuito de produzir terror e dificultar a abertura política, praticados por setores da denominada “linha dura” dos quartéis, a exemplo do Riocentro, culminando, inclusive, com o brutal atentado que vitimou a secretária da OAB Lyda Monteiro da Silva, em 1980.
Recorde-se do episódio da tentativa de expulsão de Javier Alfaya, então presidente da UNE, por não se tratar de brasileiro; ele é espanhol; definida pelo imortal Conselheiro Sobral Pinto com os adjetivos “ilegal, monstruosa e inconstitucional”.
A campanha pelas Diretas Já e a luta pela convocação da Assembléia Nacional Constituinte foram bandeiras empunhadas pela OAB e sem a qual, no caso da Constituinte e suas conquistas, dificilmente encontrariam bom termo. Isso tudo, não sem antes se defrontar com novos abusos do regime, a exemplo da invasão da seccional da OAB do Distrito Federal e seu posterior incêndio.
Passada a agonia nacional com a morte de Tancredo Neves, a nova Constituição Federal, o governo Sarney e eis que se conquista o direito de escolha direta do Presidente da República, marco real do Estado de Direito, seguindo-se do nosso primeiro processo de impedimento de um Presidente, demonstrando quão árduo seria o aprendizado democrático, a OAB iniciou o processo que levou à perda do mandato, o então Presidente Fernando Collor de Mello.
A luta permanente da OAB pela ética no exercício da política e da transparência no exercício e nas práticas da administração pública são bandeiras perenes de busca pelo respeito ao cidadão brasileiro, ao lado da proteção da Constituição e os excessos do príncipe de plantão. 
A OAB plural de tantos causídicos que habitam e atuam em cada canto e rincão do nosso vasto país, possibilitando com a essencialidade da sua atividade-função, a real efetivação da boa Justiça, por todos eles e em respeito à sociedade brasileira é que a OAB jamais se calará ante as injustiças ou qualquer fio de ameaça, quiçá, ameaças de grosso calibre, dirigidas ao livre fluir do seu papel institucional de interesse coletivo.
É precisamente essa rica história da OAB, que se confunde e se interpenetra com a história recente do nosso país, cuja relevância da atuação perene e independente tanto contribuiu e contribui para o atual rumo de consolidação das nossas instituições democráticas, que se constitui em razão maior para se afastar qualquer espaço para pressões ilegítimas de entidades de classe e outros oportunistas que tais, que, se não olvidam a referida história, somada ao presente de luta, aderem à lógica do “leão caído”, se limitando a defender interesses granjeiros, aproveitando-se de cenário isolado pendente e que urge solução, em matéria de preenchimento de vaga em tribunal nacional, congelada que fora por ora, sua atribuição revestida de legitimação constitucional de escolha dos seus representantes nos tribunais pátrios.

Bruno Espiñeira Lemos
Advogado
Procurador do Estado da Bahia
Mestre em Direito – UFBa
Doutorando em Direito - UBA
Prof. Direito Constitucional
Ex-Procurador Federal