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[Desafios contemporâneos à advocacia pautam 3º Encontro Sertanejo]

Desafios contemporâneos à advocacia pautam 3º Encontro Sertanejo

Painéis vespertinos discutiram ética, prerrogativas, publicidade e violência contra a mulher

A tarde do último dia do 3º Encontro Sertanejo tratou de temas que dizem respeito ao exercício cotidiano da advocacia. Com a presença de membros ilustres da OAB-BA , o evento, realizado na Câmara Municipal de Mucugê, região da Chapada Diamantina, reuniu a advocacia baiana para diagnosticar os desafios contemporâneos da profissão. A gravação do evento está disponível no canal da OAB-BA, no Youtube.

Equidade

O Painel 4, Respeito à Diversidade, Gêneros e Relações étnico-raciais, foi mediado pela advogada, conselheira estadual e presidente da Comissão de Diversidade da subseção de Itaberaba, Alyne Santiago, e contou com a presença das advogadas Christianne Gurgel, vice-presidenta da OAB-BA e membro da Comissão Nacional de Direitos Humanos da OAB; Célia Costa, ex-procuradora do Estado e consultora jurídica em Políticas Públicas e Direito Administrativo; e Daniela Portugal, professora de Direito Penal e Criminologia na UFBA e presidenta da Comissão da Mulher Advogada da OAB-BA.

Célia Costa, ex-procuradora do Estado, consultora jurídica em Políticas Públicas e Direito Administrativo e responsável por abrir o turno vespertino do Encontro Sertanejo destacou a presença da paridade e das questões raciais dentro da OAB-BA: “Estas pautas vieram para ficar, e é fundamental que elas estejam acesas para as pessoas que atuam na educação ou no atendimento à sociedade. Temos que enfrentar essas questões a partir de políticas públicas, buscando a igualdade e a equidade. Por isso é tão importante ver que a OAB-BA não se furta à influência que as discussões sobre essas questões provocam dentro da instituição”, completou. 

Daniela Portugal, professora de Direito Penal e Criminologia na UFBA e presidenta da Comissão da Mulher Advogada da OAB-BA, dedicou sua participação a comentar a relevância e as condições de possibilidade do novo Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero publicado pelo Conselho Nacional de Justiça em 2021: “O documento antevê uma Justiça que reconhece as singularidades das pessoas envolvidas em um processo. Mas, quando é proposta uma nova perspectiva de imparcialidade, interessada nas peculiaridades de cada caso, os nossos magistrados vão cumprir? É um caminho muito difícil. O Direito é uma construção social que se dá no campo da comunicação - não acredito que as mudanças partam de letra de um texto normativo, em si, mas da política das ruas. E a OAB, enquanto instituição, mas, principalmente, enquanto um agrupamento de pessoas politicamente interessadas, está apta a exigir que esta nova concepção de imparcialidade seja construída e aplicada”.

Encerrando o quarto painel, Christianne Gurgel, vice-presidenta da OAB-BA e membro da Comissão Nacional de Direitos Humanos da OAB, apresentou reflexões sobre a criação de espaços para que a advocacia esteja alinhada com procedimentos equitativos: “É necessário que nós, advogadas e advogados, estejamos atentos para fatores que auxiliem a construção de um meio ambiente de trabalho digno, saudável, respeitoso e inclusivo: a existência de um regulamento interno dedicado à diversidade, a revisão das políticas de seleção para desmantelar preconceitos e discriminações, a adequação das empresas às diversidades presentes na sociedade, ações para que grupos minoritários tenham perspectivas de ascensão na carreira e a instalação de ouvidorias para escutar múltiplas demandas são alguns dos exemplos. No fundo, o tema é o mesmo: o combate ao ódio - ódio que não nos cabe mais”, completou.

Prerrogativas

O Painel 5, intitulado “Indispensabilidade da advocacia e a criminalização da violação de prerrogativas”, reuniu os advogados Hermes Hilarião, diretor e tesoureiro da OAB-BA; Victor Gurgel, presidente da Comissão de Direitos e Prerrogativas da OAB-BA; Maria Luiza Brito, conselheira da subseção de Guanambi da OAB-BA; Jacson Cupertino, presidente da subseção de Ilhéus da OAB-BA; além do procurador-geral da OAB da Bahia, Rafael Mattos.

Mediada pelo tesoureiro da OAB-BA Hermes Hilarião, a mesa começou com a apresentação do presidente da Comissão de Direitos e Prerrogativas da OAB-BA Victor Gurgel, que ressaltou a importância da Lei de Abuso de Autoridade (13869/19): “Esta Lei é uma vitória da advocacia, pois permite que agentes públicos sejam punidos ao violar prerrogativas da advocacia. No entanto, é preciso que a classe tenha consciência para registrar cada violação - a formalização é o caminho para salvaguardar as garantias da profissão”.

O presidente da subseção de Ilhéus da OAB-BA, por sua vez, destacou características que transcendem a dimensão penal do Direito enquanto solução para a violação de prerrogativas: “Existem questões estruturais, como o racismo, que interferem e alimentação a situação de violação das nossas prerrogativas - e que a criminalização não consegue resolver. É preciso atacar as questões, como a racial, em sua estrutura; não que o advogado branco não tenha suas prerrogativas aviltadas, mas o negro tem muito mais - da chegada em uma delegacia às condutas do magistrado nas mesas de audiências. Isso é visível no dia a dia e não pode ser naturalizado - o racismo não pode ser naturalizado”, completou.

Em uma participação que não estava programada, o procurador-geral da OAB da Bahia, Rafael Mattos, sublinhou alguns dos desafios atuais enfrentados pela classe: “Vivenciamos, há alguns anos, um movimento de criminalização da advocacia - criminal, municipalista e eleitoral, por exemplo, que não pode continuar. Venho me assustando com a quantidade de casos em que há denúncias contra advogados pelas práticas corriqueiras do exercício da profissão. Por isso preservar e ampliar a imunidade é fundamental: não se pode banalizar a violação de prerrogativas. Quando nós encaramos uma violação, por menor que seja, sem a devida gravidade, nós cedemos espaço à injustiça. E isto não podemos permitir”,

A conselheira da subseção de Guanambi da OAB-BA, Maria Luiza Brito, por sua vez, reforçou em seu discurso o sentido da luta pelas prerrogativas: “Nós, advogadas e advogados, não somos uma visita ao sistema de justiça, mas parte integrante deste. É triste que um juiz, um servidor ou um policial não compreendam o papel da advocacia, que defende e salvaguarda os direitos e as garantias de toda a sociedade. E não há exercício do Direito de Defesa Pleno sem a observância das prerrogativas”.

Atuação nas redes
  
O Painel 6, “Novo Código de ética e os impactos das novas regras de publicidade para a advocacia jovem”, contou com a participação dos advogados Ary Raghiant, ex-corregedor nacional da OAB; Emilia Roters Ribeiro, vice-presidenta do Tribunal de Ética Disciplinar da OAB-BA; Sarah Barros, presidenta do Conselho Consultivo da Jovem Advocacia (CCJA); e Gabriela Macedo, advogada, professora de pós-graduação e fundadora do instagram @falecomaadv. A mesa foi mediada pelo  diretor de planejamento do CCJA, Mailson Conceição.
 
Apresentando e debatendo tema central do painel, Ary Raghiant, ex-corregedor nacional da OAB, dissertou sobre o novo Provimento da Publicidade na Advocacia (Provimento n. 205/2021): “Foi um modo de reconhecer a dissolução de fronteiras para o exercício da advocacia e de nos atualizarmos a partir das demandas de jovens advogados e advogadas, sem nos desviarmos das linhas mestras da nossa atuação: moderação, sobriedade e conteúdo informativo. Observando estes três fatores, o novo Provimento permite à jovem advocacia se apresentar para a sociedade brasileira”. 

Emilia Roters Ribeiro, vice-presidenta do Tribunal de Ética Disciplinar da OAB-BA, comentou sobre o caráter vinculante e a ética aplicada a partir do Provimento n. 205/2021: “O Provimento diz respeito a toda advocacia, pois as novas tecnologias e os desafios de publicidade correspondentes não dizem respeito apenas à jovem advocacia. E o novo provimento, sem modificar as condições para uma atuação ética, se atualizou a partir do exercício contemporâneo da profissão - ao mencionar WhatsApp, chatbot e cowork, por exemplo. Isto é: ao profissional da advocacia é permitido se valer das redes sociais - desde que o conteúdo importe, seja ético, não fira as normas que regulam nossa conduta”, concluiu.

Sarah Barros, presidenta do Conselho Consultivo da Jovem Advocacia, apresentou a percepção das jovens advogadas e advogados: “É importante destacar, em meio aos novos meios de comunicação e sociabilidade, que a Jovem Advocacia não quer ferir o Código de Ética;o que pedimos é, apenas, uma definição clara dos procedimentos que são ou não são permitidos, já que a publicidade é uma instância tão importante para nós, vide a dificuldade de alguém recém admitido na profissão se inserir no mercado de trabalho. É um ponto sensível, mas que foi contemplado pelo Provimento. A Jovem Advocacia precisa de condições para atingir melhores preparação e valorização, e a OAB-BA tem sido essencial nesta busca”.

Representando a dimensão prática da questão,  advogada, professora de pós-graduação e fundadora do instagram @falecomaadv Gabriela Macedo discorreu sobre o impacto das novas regras de publicidade para a advocacia jovem a partir da sua atuação: “Enquanto uma das primeiras advogadas a atuar nas redes sociais, posso garantir que o novo Provimento produziu maior segurança para que o profissional esteja  nas redes e saiba que aquele é um espaço para a Jovem Advocacia. Afinal, os hábitos de consumo da sociedade mudaram - e as mídias sociais podem ser uma forma democrática, e ética, de dar ferramentas para que os advogados possam obter conhecimento e ter visibilidade para exercer sua profissão de forma cada vez melhor”, completou.

Violência contra a mulher

O último painel do Encontro Sertanejo teve a "Advocacia nas demandas de violência contra mulher" como tema, e reuniu as advogadas Marilda Sampaio e Silvia Cerqueira, conselheiras federais da OAB, e a advogada Luciana Silva, presidente da subseção de Vitória da Conquista da OAB e coordenadora da Clínica de Direitos da UESC.

A conselheira federal da OAB Marilda Sampaio destacou o papel da instituição na busca da solução das violações históricas e estruturais que atingem as mulheres: “Não existe organismo mais preparado para ir de encontro aos preconceitos e às violências historicamente infringidas às mulheres do que o sistema institucional da OAB. Nós, que temos mais de 90 comissões dedicadas a defender a justiça social e os direitos humanos, e sabemos o quanto é importante defendermos a aplicação da lei, precisamos consolidar o exemplo, através da união da nossa classe contra a violência que as mulheres sofrem; isto fará a sociedade avançar”, defendeu.

Luciana Silva, presidente da subseção de Vitória da Conquista da OAB e coordenadora da Clínica de Direitos da UESC, também chamou atenção para a função desempanhada por todos os membros do campo jurídico no combate às violações contra as mulheres: “O Direito é um instrumento fundamental para romper a desigualdade e auxiliar na conteção da violência contra as mulheres, que ainda é um dos traços constitutivos da nossa sociedade. E precisamos lembrar, a todo instante, que nossa Constituição assumiu o compromisso de tentar extirpar toda espécie de discriminação com relação ao sexo, e isto se reflete em acontecimentos recentes”.Luciana mencionou, ainda, a resolução do Conselho Nacional de Justiça que é pautado por questões de gênero: “É importante, por exemplo, que toda a advocacia esteja a par do o novo Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero, publicado pelo CNJ, que posiciona o gênero como fundamental para compreender e modificar a sociedade para melhor. Nosso papel, como advogados e advogadas, é não aceitar que as mulheres continuem sendo vitimadas por intensificações nas violências pelas quais elas passam cotidianamente”, acrescentou.

A advogada e conselheira federal da OAB, Sílvia Cerqueira, fechou o ciclo de participações da última mesa, realçando o sentido e as escolhas institucionais que estão auxiliando no combate às questões estruturais que desafiam a equidade na organização e no exercício da advocacia: “É explícito que o legado nefasto de violências que estruturaram nossa história, como a escravidão, se faz presente no dia a dia da nossa profissão, e é um dos motivos para a constante violação de prerrogativas que as mulheres negras e advogadas sofrem. Neste contexto, é essencial que a OAB esteja pavimentando o caminho a partir da paridade e da compreensão de que as cotas ainda cumprem um papel na busca de uma democracia efetiva, que reconheça a atuação das advogadas e das advogadas negras como um dos pilares desta instituição quase centenária”, completou.

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Foto: Angelino de Jesus/OAB-BA