Entrevista da semana: Adriano Batista
Nos últimos seis anos, a OAB da Bahia investiu no seu sistema de prerrogativas, com criação e fortalecimento de instituições como a Comissão de Direitos e Prerrogativas, Procuradoria de Prerrogativas, Plantão de Prerrogativas e, mais recentemente, a Câmara de Prerrogativas. Como enxerga essa evolução do Sistema OAB?
Adriano Batista - De fato, a OAB da Bahia tem experimentado uma evolução muito grande no que diz respeito à sua estrutura para o combate à violação das prerrogativas. Nós temos uma comissão, hoje, com 60 advogados voluntários que se dividem em plantões, relatorias de processos, grupos de trabalhos, porque nós estamos procurando prevenir as violações, mudar a cultura. Estamos intensificando o diálogo com as autoridades e serventuários para fazer com que esse pensamento que autoriza a violação deixe de existir. Esse tem sido o nosso trabalho.
Eu não acredito que juízes e serventuários acordem de manhã com o desejo de prejudicar o trabalho do advogado e violar prerrogativas. Acho que isso aí não reflete a realidade. Pra mim, o grande problema hoje é a falta de estrutura do Judiciário, do Estado no que diz respeito às penitenciárias, delegacias, a falta de material humano. Tudo isso desemboca no trabalho do advogado. Um juiz que tem muitos processos, mas não tem assessores suficientes e juízes auxiliares ao lado dele, acaba vendo o advogado que o interrompe e que vai falar com ele sobre algum processo como alguém que está lá para atrapalhar o trabalho dele. Por isso que muitas vezes ocorre negativa de atendimento e violações de prerrogativas. Um delegado que não tem sequer uma estrutura para guardar um processo na delegacia, muitas vezes tem que levar o processo para casa e, quando o advogado chega lá e quer ver o processo, ele não está nem lá, porque o delegado sequer tem um armário com chave para trancar os seus inquéritos. Tudo isso gera violação de prerrogativas.
É óbvio que existem os excessos, mas via de regra a grande vilã das violações é a falta de investimento e estrutura que faz com que o serventuário, magistrado, delegado, desembargador, não tenham a disponibilidade de prestar um bom serviço e, na hora que o problema se apresenta, o advogado acaba sendo prejudicado.
A OAB da Bahia acaba de realizar o último de uma série de desagravos aprovados pela Câmara de Prerrogativas. Qual a importância deste instrumento para restaurar as garantias dos advogados que têm seus direitos violados?
Adriano Batista - Todos os desagravos que foram aprovados na primeira sessão da Câmara de Prerrogativas já foram efetivados. Isso é muito importante, porque, quando o advogado procura a sua entidade, a OAB, em busca desse amparo para obter um desagravo pela ofensa que foi sofrida, ele quer celeridade, quer ter essa honra restaurada de forma rápida, ele não pode esperar anos para que sua entidade o ampare.
Nós, quando chegamos na OAB, encontramos processos de desagravo já aprovados pelo Conselho pendentes há dez anos. Então, na gestão passada, nós conseguimos revisar alguns desses desagravos, até porque tivemos dificuldades de encontrar o processo, de encontrar o advogado, mas nós, com esforço muito grande, tentamos colocar em dia essas situações.
Nessa nova gestão, o presidente Fabrício tomou isso como uma meta primordial e nós, além de continuarmos os processos ainda pendentes, que já não são muitos, estamos, também, evitando que esse passivo aumente. Então todos os desagravos que estão sendo aprovados na Câmara já estão sendo realizados de forma imediata e isso, com certeza, é uma forma de dizer para o advogado e sociedade que a OAB está atenta, que é sensível ao pleito e está unida em toda essa luta em defesa das prerrogativas.
O que um advogado ou advogada que acabou de ter um direito violado deve fazer?
Adriano Batista - Quando um advogado ou advogada tem a sua prerrogativa violada, a primeira coisa que ela ou ele tem que fazer é se autodefender. O advogado não pode baixar a cabeça diante de uma violação. Ele precisa enfrentar o agressor, dentro dos limites da urbanidade e da argumentação. Ele tem que se defender, mostrar a lei. Da mesma forma que ele argumenta por um cliente, também tem que argumentar em sua própria defesa.
Obviamente que, se isso não surtir o efeito desejado, ele tem que procurar a OAB de onde quer que esteja. Aqui, na Bahia, ele vai acionar pelo Plantão de Prerrogativas, que tem telefone fixo (71 3321-9034). Se não for em horário útil, ele pode ligar no celular (71 99902-1852), que também tem plantão 24 horas, e nós vamos tentar dar o suporte que ele precisa. Muitas vezes, é o caso de uma intervenção emergencial. A gente, então, acaba deslocando alguém ao encontro dele e, se for o caso que demande uma análise mais apurada, algum tipo de investigação ou contato posterior com algum tipo de autoridade, a gente vai fazer o trabalho de ir até essa autoridade, de oficiar, marcar uma reunião ou, se for o caso, já remeter para nossa Procuradoria de Prerrogativas, para que seja analisada a questão e tomada providência jurídica.
Além da segunda gestão à frente da Comissão de Direitos e Prerrogativas da OAB-BA, você também é membro da recém-criada Câmara de Prerrogativas. Qual a importância do órgão?
Adriano Batista - Há muito tempo que a gente queria mudar a estrutura do Conselho daqui de Salvador no que diz respeito à análise das questões que envolvem prerrogativas. Eu comentei isso com o presidente Fabrício e ele se transformou no maior defensor da causa. Nós seguimos o modelo da OAB do Paraná e aplicamos na nossa seccional aquilo que era conveniente. O presidente Fabrício abraçou a causa e, como é bem do estilo dele, criou imediatamente a Câmara de Prerrogativas, obviamente passando pelo Conselho Pleno. Eu posso dizer que a Câmara é um sucesso. Primeiro, porque garante celeridade ao julgamento. Para vocês terem uma ideia, os desagravos eram julgados pelo Conselho Pleno. Como o Conselho Pleno tem uma pauta institucional e administrativa extensa, não era raro que processos fossem adiados por falta de tempo e outras situações. Com a criação da Câmara, nós garantimos que cerca de 15 conselheiros estejam voltados exclusivamente para as análises dos desagravos. Isso garante celeridade nos julgamentos e, com isso, você tem uma resposta rápida ao advogado que pediu o desagravo.
As comissões da OAB da Bahia têm exercido atuação decisiva em diferentes esferas não só da advocacia, mas da sociedade. Como enxerga esse trabalho estando à frente da coordenação das comissões?
Adriano Batista - O trabalho de coordenar as comissões é um desafio enorme. São muitas comissões voltadas ao exercício profissional, ao dia a dia do advogado, às áreas de atuação da advocacia, e essas comissões precisam estar bem organizadas, bem estruturadas, para que o advogado tenha condição de trabalho e tenha condição de intervir com mais eficiência naquelas áreas de direito onde atua. Então é muito importante que a gente dê esse apoio e consiga ajudar esses advogados nessas empreitadas que dizem respeito à classe e à sua própria atuação.
Por outro lado, existem comissões que dizem respeito a questões macro da sociedade, como a Comissão da Mulher e de Direitos Humanos. Nós temos que participar das discussões da sociedade, e a OAB é, também, a porta de entrada de muitas entidades religiosas, de entidades de classe, que veem na OAB uma parceria de suas lutas. A OAB não fecha as portas para ninguém. Então é por meio dessas comissões que isso se materializa, que esse apoio acontece e que a OAB procura ajudar toda a sociedade civil. E é por meio das comissões que o advogado consegue estar dentro da OAB e dar amplitude a seus sonhos e seus trabalhos.
A Comissão de Prerrogativas recebe, diariamente, queixas e denúncias que vão desde a dificuldade de atendimento nos juizados a agressões físicas e verbais. Quais as reclamações mais recorrentes entre a advocacia e as principais formas de atuação a essas violações?
Adriano Batista - A gente recebe vários tipos de queixas, mas são muito sazonais. No início da gestão passada, a questão envolvendo o Banco do Brasil, alvarás, era muito forte. Passamos, também, por uma situação que ainda acontece muito, que é a negativa de atendimento por parte dos magistrados. Essa ainda é a nossa reclamação campeã. Não são todos, mas a minoria que cria resistência no atendimento causa danos. Temos muitas questões, também, evolvendo delegacia. Muitas vezes, o advogado chega à delegacia e não consegue ter acesso ao cliente. Muitas vezes, o preso é "guardado" a sete chaves, justamente para que o advogado não passe nenhum tipo de recomendação, fazendo com que o direito de defesa dele seja exercido pela metade. Às vezes, quando o advogado tem acesso ao preso, ele já foi até interrogado. Essas são situações que acontecem todos os dias e que a gente tem estado firme para tentar impedir. Tem muita questões, também, envolvendo administração pública, referentes à dificuldade de acesso aos processos, pedido de procuração. Enfim, são diversos tipos de violação que nós tentamos combater diariamente com diálogo, contatos e intervenções e, graças a Deus, a resposta tem sido boa.
Em 2018, o Sistema de Prerrogativas da OAB atuou em 45 novas ações judiciais, entrou com 29 medidas no Conselho Nacional de Justiça e interveio em 66 medidas administrativas. Como esses números refletem no trabalho interno da OAB?
Adriano Batista - De fato, nós não temos uma Comissão de Prerrogativas, um Procuradoria de Prerrogativas. Nós temos um Sistema de Prerrogativas, no qual a comissão funciona como porta de entrada para essas reclamações. O advogado com prerrogativa violada procura a comissão, onde vai ter o atendimento inicial. É lá que vamos tentar apagar o incêndio e resolver o problema.
O trabalho da Comissão de Prerrogativas é muito difícil e requer dedicação. Só pode ser voluntário da comissão aquele advogado que tem a capacidade de se solidarizar com a dor do outro, porque nós atendemos, muitas vezes, colegas desesperados, aflitos, com medo, ameaçados. E nós precisamos ter uma espécie de colo para dar a esses colegas, temos que ter a capacidade de entendê-los, de ouvi-los, de sair em sua defesa. Por outro lado, é preciso que os advogados tenham sensibilidade para perceber que o momento é muito difícil. A falta de estrutura e de investimento do Estado acaba gerando mais violação de prerrogativas. Então é preciso ter bom senso, diálogo e trabalho.
As questões fora do alcance da comissão são encaminhadas para a Procuradoria de Prerrogativas. Então tudo que sai da esfera administrativa, do contato, do diálogo, vai para a Procuradoria, para que ela analise se é possível entrar com alguma medida judicial. Nós somos, portanto, um corpo, um Sistema de Prerrogativas, que atua de forma interligada, mas cada um com seu papel bem definido. Eu diria que a Procuradoria de Prerrogativas é o braço jurídico da OAB, ela que judicializa em nome do advogado, garantindo a existência de um procedimento padrão aos processos. Existe, ali, uma disciplina de escritório de advocacia diferente da comissão, que tem trabalho voluntário.
Então vemos com muita alegria que esse trabalho em conjunto esteja dando resultado. São muitas alegrias e vitórias. A Procuradoria é comandada por duas pessoas de muito diálogo com a gente, Mariana e Rodrigo. Temos um trabalho de muita sinergia, que vem rendendo muitos frutos para a classe. Espero que o presidente continue investindo nas prerrogativas, para que possamos ter mais agilidade ainda, porque é preciso ter estrutura. As violações têm crescido muito, e, hoje, o advogado está atuando em diversos ambientes. É muito diversificada a atuação da classe e diversificada é a violação de prerrogativas.
A Comissão de Prerrogativas teve atuação decisiva em casos como no do pagamento de alvarás do TJBA pelo Banco do Brasil. Quais principais conquistas da comissão para a advocacia poderia destacar?
Adriano Batista - A Comissão, junto com a Procuradoria, conseguiu, com muito diálogo e com medidas judiciais, reverter aquela situação caótica que estava se apresentando, em 2016, 2017, relacionada ao pagamento dos alvarás dos advogados. É um problema recorrente que volta e meia aparece de novo. Agora mesmo, nós estamos com um problema com a Caxa Econômica. Esperamos que não chegue ao ponto que chegou com o Banco do Brasil, mas, se precisar, estaremos lá, com certeza.
Temos, também, outras situações emblemáticas, como nossa atuação junto ao Juizado Especial, em parceria com a Comissão de Juizados. Mas eu diria que a conquista mais importante é a existência da própria comissão, organizada da forma como ela está e dando ao advogado a certeza de que vai ter um amparo. Isso tem gerado uma tranquilidade para o advogado, um sentimento de força e união que nunca foi visto na Bahia. Então a conquista é a própria comissão, o plantão 24 horas, que permite que o advogado acione a OAB a qualquer tempo, e o plantão judiciário. Esta é a certeza de que não estamos sozinhos.
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