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[OAB da Bahia divulga Carta da IV Conferência Estadual da Mulher Advogada ]

OAB da Bahia divulga Carta da IV Conferência Estadual da Mulher Advogada

Leitura do documento aconteceu ao final do evento no Centro de Convenções Salvador

A OAB da Bahia divulgou a Carta da IV Conferência Estadual da Mulher Advogada, lida ao final do evento realizado nas últimas segunda (22/07) e terça-feira (23/07), no Centro de Convenções Salvador. Com 100 palestrantes mulheres, a conferênca reuniu mais de 1,4 mil pessoas em vinte e quatro debates que refletiram a pluralidade da mulher advogada, contemplando aspectos desde a violência de gênero a questões relacionadas à advocacia feminina. Confira:

Carta da IV Conferência Estadual da Mulher Advogada da OAB da Bahia

Aos 22 e 23 de julho do ano de 2024, aconteceu a IV Conferência Estadual da Mulher Advogada, evento trienal organizado pela OAB-BA, que teve como tema “Mulheres Plurais: caminhos para mudar o mundo”.

Parafraseando as belas lições trazidas pela Excelentíssima Ministra do Supremo Tribunal Federal Cármen Lúcia, em sua conferência magna, cada uma de nós somos, em si um plural. Cada uma de nós tem muitas faces e fases em nossas caminhadas da vida. E, juntas, somos plurais, sempre – é essa a força coletiva que nos move.

Não somos (apenas) um movimento de mulheres, mas mulheres em movimento. Uma andança que encontra obstáculos, mas, também, muitas parceiras e parceiros nessa estrada. Um caminho que nos leva aos sonhos, a um “novo horizonte”, como destacou nossa Presidenta Daniela Borges ao citar a “utopia” de Galeano.

Escolhemos, cuidadosamente, como tema, “Mulheres Plurais”, porque cremos na pluriversalidade como chave para o futuro não tão distante que estamos, hoje, e a muitas mãos, construindo. Não são desejos restritos às “mulheres advogadas”, e sim partilhados por aquelas e aqueles que se dedicam a semear o novo tempo, pautado na igualdade, não unicamente de gênero, mas também racial, econômica e em tantas quantas forem as intersecções que lhe garantam a devida substancialidade.

Dentre os caminhos para mudar o mundo, não há atalhos. É preciso “desenhar os próprios pés”, como citou nossa vice-presidenta Christianne Gurgel ao declamar o “Cântico Negro”, de José Régio. Que nas encruzilhadas, entre os muitos “nãos” que encontramos no caminho e em diáspora, saibamos cultuar a ética do amor ensinada por Chiara Ramos em sua conferência magna no Julho das Pretas – que o autocuidado e o cuidado ao próximo não se percam pela passagem.

Mais do que painéis, tratamos de sonhos, pautas, direcionamentos. Falamos de igualdade; maternidade; direitos reprodutivos; lideranças femininas; representatividade política; políticas públicas; responsabilidade social e de uma nova comunicação porque são construções que pavimentam a nova era que pretendemos.

Falamos, também, de violências de gênero, domésticas ou institucionais e estatais, em especial daquelas que vulnerabilizam as mulheres negras, porque nos queremos livres, e, como bem cantou Nina Simone, “liberdade é não ter medo”.

Mobilizamos, ainda, reflexões relacionadas a estratégias alternativas de resolução de disputas; desafios e oportunidades para mulheres; além de críticas ao nosso Sistema Judiciário, em que recebeu destaque a dificuldade em se ver imprimir, efetivamente, uma perspectiva de gênero nos mais diversos campos jurídicos, como em casos de combate ao assédio no ambiente de trabalho, ou ainda na execução de uma pena digna em nossos sistemas carcerários.

Falamos de etarismo e dos preconceitos relacionados ao envelhecimento, e abordamos também as demandas da jovem advocacia. Também foi pauta de nosso evento questões especialmente voltadas para a advocacia, quando tivemos a oportunidade de discutir litígios em redes sociais; inovações na advocacia; mulheres empreendedoras no setor jurídico; direitos e prerrogativas das mulheres advogadas e, em construção interdisciplinar com o Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre a Mulher da Universidade Federal da Bahia e com seu Programa de Pós Graduação (NEIM/PPGNEIM-UFBA), debatemos as perspectivas e desafios para o Direito.

Ligamos presente, passado, e futuro, tratando do histórico de violência institucional contra mulheres através de nossas codificações, bem como da participação feminina em prol da construção de um (novo) Estado Democrático de Direito. Tivemos o lançamento de livros e o oferecimento de cursos, oficinas, capacitações e serviços, contando com irrestrito o apoio da Escola Superior de Advocacia, da Caixa de Assistência dos Advogados da Bahia e de outras instituições públicas, privadas e de escritórios de advocacia que, tal qual os participantes neste evento, acreditam e cooperam para seguirmos para uma nova realidade social.

Dentro de nosso grande complexo de atividades, realizamos a reunião das Presidentas de Subseção das Comissões da Mulher Advogada e das Comissões de Proteção dos Direitos da Mulher, pois é com a escuta atenta e ativa que podemos, na interlocução com o interior, pensar estratégias de aprimoramento do nosso Sistema.

No diálogo com as Subseções, pudemos colher propostas de melhorias, dentre elas o fortalecimento da rede entre as diversas comissões que pautam a defesa da mulher e a melhoria da comunicação entre as comissões estaduais e municipais. Esses espaços de intersecção passarão a integrar nossos compromissos e pautas institucionais.

Sediamos, ainda, o Fórum da Rede de Enfrentamento à Violência Contra a Mulher, construindo significativa interlocução interinstitucional entre OAB-BA, DPE-BA, MPE-BA, TJ-BA, SPM, SPMJ e SSP. Foram tantos encontros e reflexões, mas uma preocupação sempre nos guiou: que não sejam, apenas, palavras ao vento. Como ensina a filósofa Angela Davis, tão citada entre os diversos painéis e mesas temáticas, “não aceito mais as coisas que não posso mudar, estou mudando as coisas que não posso aceitar”.

Colhemos, cuidadosamente, os encaminhamentos que foram feitos ao longo do evento, a exemplo da criação de um fórum especialmente voltado para trabalhar as intersecções entre mulheres advogadas e advogadas negras; implementação de um Observatório Nacional dos Direitos das mulheres, assim como tantas outras propostas e encaminhamentos que irão compor a agenda de ações de nossas Comissões e, evidentemente, da nossa Diretoria.

Refletimos sobre lawfare de gênero, que consiste em um padrão de violências do sistema de (in)justiça contra as mulheres, qualquer que seja a posição que ocupem, e apontamos a necessidade de fomento à presença das mulheres nos órgãos públicos, iniciativa privada e sistema ordem, bem como a necessidade de se implementar ações positivas que possam protegê-las nesses espaços.

Como bem lembrou a Ministra Cármen Lúcia, considerando todo o sistema Judiciário, em seu sentido amplo, em comparação com outras instituições, é na OAB em que se encontra a mais expressiva participação feminina. Por sua vez, se o maior número de inscrições na OAB é de mulheres, por que não são elas que apontam a direção? Somos maioria e temos poder para fazer amplificar as nossas vozes. Vozes que, em sua pluralidade, clamam por mudanças e por igualdade material.

É esse o rumo para onde os novos ventos nos levam, com toda a força, e com toda a consciência crítica de suas interseccionalidades, especialmente na compreensão de que vencermos as nossas desigualdades de gênero passa, inevitável e inflexivelmente, por enfrentarmos o racismo estrutural e a desigualdades sociais, dentre tantas outras especificidades e opressões, que ainda nos distanciam das (ainda) utopias que nos movem. Pés no chão e mãos na terra para semearmos as mudanças. As mudanças – palavra de força, palavra feminina. Sementes, mudas e, em um futuro não tão distantes, novas raízes, novas estruturas, terra fértil para tudo o que podemos e desejamos ser.

Salvador, 23 de julho de 2024