Direitos eleitorais e direitos políticos marcam tarde do Congresso de Direito Eleitoral da Bahia
Evento acontece na Assembleia Legislativa da Bahia entre 9 e 10 de junho
A primeira tarde do I Congresso de Direito Eleitoral da Bahia, que teve início nesta quinta (9), teve a reconfiguração do processo eleitoral a partir das ferramentas digitais e a proteção dos direitos políticos como temas norteadores. O terceiro painel do congresso, intitulado Direito Eleitoral Digital, inaugurou a segunda parte do evento debatendo a relação intrínseca que a internet e o processo eleitoral desenvolveram nos últimos anos.
Eleições e internet
A abertura da mesa foi realizada com a conferência de Diogo Rais, cofundador do Instituto Liberdade Digital e autor do livro Direito Eleitoral Digital. Ele defendeu a consonância dos temas: “Talvez a gente não consiga separar o Direito Eleitoral do Digital, pelo papel que a Internet passou a desempenhar em nossas vidas. Pesquisas mostram, por exemplo, que as redes sociais e ferramentas digitais pautam, cada vez mais, o voto dos eleitores. E a Internet se tornou o espaço para se fazer política, modificando o papel do eleitor: ele é cada vez mais responsável pelo processo eleitoral. A atenção com o Direito Eleitoral Digital deixou de ser apenas desejável, se tornando necessária”, reforçou.
Fernanda Lage, pesquisadora em Direito e Inteligência Artificial na UnB e professora adjunta da Universidade de Brasília, deu prosseguimento ao painel abordando as consequências da atual configuração da internet: “Convivemos, hoje, com um condicionamento incessante da filtragem algorítmica, que cria câmaras de eco - isto é, bolhas. O acesso de um eleitor ou eleitora a informações que vão das política à cultura segmenta o conteúdo que cada pessoa recebe. Isso prejudica o processo eleitoral. É por isso que, para uma atuação adequada da Justiça Eleitoral, ela precisa se atualizar incessantemente”.
Para Alexandre Basílio, terceiro palestrante da mesa, a nova realidade do Direito pede uma formação continuada de advogados e advogadas. Membro da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político e analista judiciário do Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Sul, Basilio defendeu que os profissionais integrem o tripé solicitado pela nova realidade dos processos eleitorais à sua formação: “A atuação dos advogados e advogadas eleitoralistas precisa do conhecimento atualizado do Direito Eleitoral, do Marketing e do Direito Digital, isto é, da tecnologia aplicada ao Direito. Há casos, no Brasil, de candidatos que não pisaram na rua e foram eleitos. Isso reforça nossa responsabilidade”, encerrou.
Neomar Rodrigues, membro da Comissão de Direito Eleitoral da OAB/BA e articulista de Direito Eleitoral do site Política Livre, apresentou, por sua vez, um recorte específico sobre a figura do Digital Influencer, elencando possíveis limitações à sua atuação: “Há um dispositivo do novo Código Eleitoral que, caso aprovado, incidirá em uma grave discriminação dos influencers, que não poderiam mais falar da política partidária nas redes sociais. Precisamos estar atentos para evitar violação aos direitos fundamentais previstos na Constituição”, defendeu.
Proteção à democracia
O último painel do primeiro dia contou com a participação do ex-ministro da Justiça e da Advocacia-Geral da União, José Eduardo Cardozo, e da desembargadora Anna Graziela, juíza eleitoral no TRE/MA, além dos advogados Rafael Barretto, ex-diretor do Tribunal de Ética da OAB/BA, e João Paulo Oliveira, presidente Comissão de Direito Eleitoral da OAB/BA da subseção de Lauro de Freitas.
Dando início ao painel, o ex-ministro José Eduardo Cardozo contextualizou a discussão em níveis globais: “A Constituição define que o Brasil é um Estado Democrático de Direito, onde o poder político se submete às leis. Todo Estado de Direito é legitimado através da participação democrática. Mas a estrutura do Estado Democrático de Direito está sendo ameaçada em todo o mundo. Há um grande desgaste da democracia representativa - o modelo de Estado tem encontrado uma crise, a ponto de vermos propostas de que armas substituam as condições da democracia”.
Para Cardozo, o cenário multiplica a responsabilidade da advocacia: “A advocacia, fora do Estado Democrático de Direito, é um fantoche. Como advogados e advogadas podem apoiar o autoritarismo? É incompatível com a nossa proteção. Por isso devemos atuar, sempre, em prol das garantias e direitos estabelecidos em nossa Constituição”, defendeu.
Em seguida, o advogado Rafael Barretto, ex-diretor do Tribunal de Ética da OAB/BA, enfatizou sua atenção na função desempenhada pelo Poder Judiciário: “Precisamos observar e atuar na direção das premissas que garantem que o espaço político é dos atores políticos, significando que o Judiciário não pode ser protagonista. O que requer nossa atenção para quando este violar os direitos políticos. Precisamos assegurar o respeito institucional à posição que cada ator ocupa na estrutura política”.
A desembargadora Anna Graziela, juíza eleitoral no TRE/MA, dedicou sua participação na questão da participação feminina e proteção dos direitos das mulheres dentro dos processos eleitorais: “Há uma flagrante assimetria entre a capacidade eleitoral ativa das mulheres e a representação em cargos efetivos na política. O Brasil elegeu uma única presidenta e apenas oito governadoras em toda a sua história. E isto se deve, em parte, à timidez com a qual os mecanismos legais que fomentam a participação das mulheres na política existem”.
Anna Graziela defendeu, ainda, mais reformas para garantir a participação efetiva das mulheres na política. “Os cargos diretivos dentro dos partidos, por exemplo, são raramente exercidos por mulheres. Talvez reservá-los às mulheres seja um passo. Precisamos começar a falar da reserva de vagas, não apenas de candidaturas. Pode ser o início de uma reconfiguração necessária à efetividade dos direitos femininos”, completou.
Finalizando o primeiro dia do I Congresso Eleitoral da Bahia, o professor João Paulo Oliveira, presidente Comissão de Direito Eleitoral da OAB/BA da subseção de Lauro de Freitas, reforçou a necessidade de vinculação da atuação dos órgãos públicos com a Constituição: “É preciso extrair do ordenamento jurídico mais do que eficácia. É preciso observar a efetividade social. Direitos políticos são fundamentais e se traduzem em valores. Precisamos buscar, em suma, a soberania popular, e não a soberania dos tribunais. Agora, como os órgãos podem responder às ameaças à democracia? A partir do texto constitucional. Sempre”, completou.
A transmissão integral das participações pode ser assistida no canal da OAB-BA, no Youtube.
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