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Poder punitivo se enquadra como fenômeno político

por Flavio Ribeiro da Costa

A teoria da pena, percebida como disciplina dogmática, ao tentar justificar o poder de punir realizaria uma tarefa inconstitucional, porque a legitimação produzida pela dogmática é direcionada ao poder do juiz e não ao poder de punir. O poder punitivo não é exercido no interior do judiciário, mas pelos aparatos da burocracia administrativa que condicionam a criminalização e a punição.

Ao comungar dos princípios básicos da criminologia da reação social em sua profunda denúncia sobre a seletividade, a desigualdade e a barbárie produzidas pelos aparelhos burocráticos que possuem função repressora e sancionatória, o ministro da Suprema Corte da Argentina Eugenio Raúl Zaffaroni entende ser absolutamente dispensável uma teoria da pena, visualizando a possibilidade de reconstruir o direito penal com a finalidade de redução da violência do exercício do poder. Reduzir dor e sofrimento seria o único motivo de justificação da pena nas atuais condições em que é exercida, principalmente nos países periféricos.

No interior do modelo penal garantista, delineado pela opção político-criminal minimalista, há nova justificativa à pena, ou melhor, há verdadeiro e realista deslocamento do problema da cominação, aplicação e execução da pena do espaço jurídico ao espaço político.

A identificação simbólica dos pensadores garantistas possibilita nova orientação teleológica ao direito e ao processo penal. A pena, entendida como fenômeno da política, não encontra sustentação no direito, pelo contrário, simboliza a própria negação do sistema jurídico, e se constituem através da potencialização da violência e da imposição incontrolada de dor e sofrimento. O caráter incontrolável, desmesurado, desproporcional e desregulado da política reivindica, no âmbito das sociedades democráticos limites.

O direito penal resulta como alternativa à política, justificando-se como técnica de minimização da violência e do arbítrio; e como alternativa às punições informais e excessivas que seriam infligidas na sua ausência. Não há, no interior da teoria garantista, relegitimação da pena. Legitima-se, ao contrário, o direito, entendido como regulador e inibidor da violência política da sanção.

Para entrar na questão, devemos em primeiro lugar estabelecer um quadro teórico que se baseia neste trabalho e sua importância discursiva. É inevitável, mas nos estamos inclinados a aceitar a definição de que o Zaffaroni afirma que o direito penal é "o ramo do conhecimento jurídico que, através da interpretação da lei penal, propondo um sistema de juízes orientadores, contendo decisão e reduzir o poder punitivo, a fim de promover o avanço do Estado de direito constitucional.”

De acordo com o ministro argentino, a pena é um mero instrumento de poder que viola uma dor ou privação de direitos, sem reparação ou função reparadora e administrativa não é a coerção direta.1.

“Incapaz de encontrar um papel para o qual a pena é comprovadamente necessária, nenhuma alternativa senão a de atribuir uma qualidade negativa ou agnóstica teoria da pena”.2

Portanto, a aplicação de uma sanção por parte do Estado será sempre irracional; sendo uma simples ação de poder. Com esta base teórica, o principal papel político atribuído ao Direito Penal, que consiste em limitar o poder punitivo estatal, a primeira fase de criminalização, ou marcados pelo desenvolvimento e criação de leis é realizado por o legislador que, longe de ser boa, é o primeiro corpo que contribui para expandir o poder punitivo do Estado, através de raciocínios jurídicos.

Por meio da aplicação dos princípios jurídicos, temos que abandonar o modelo “ressocializador”, este é o primeiro efeito da teoria agnóstica da pena. Eis que os propósitos reeducacionais ou recuperadores da pena são absolutamente incompatíveis com o saber criminológico contemporâneo e em relação aquilo que se fez.

A propósito, desde a década de 1970, que a pena é imposta como castigo, devendo estar livre de preocupações metafísicas de prevenção do crime e ressocialização do criminoso. Aliás, percebe-se que, sobre a hipócrita afirmativa da recuperação, são mantidos os mais desumanos e medievais suplícios na aplicação da pena, como premissas, orientadoras de uma prática com pretensões impossíveis e/ou utópicas.